Polaridades são a divisão básica da energia primordial em
duas facetas de si mesma. Apareceu na natureza desde sua estruturação
e formação materializando-se em milhares e milhares de "formas
complementares" como macho e fêmea, dia e noite, ativo e passivo, elétrico
e magnético, simpatia e antipatia, estimulação e sedação,
ação e reação, agressão e inibição,
caçador e caça, coragem e medo, enfrentamento e fuga, atividade
e inércia, pra fora e para dentro, interior e exterior, aberto e fechado,
yin e yang, luz e sombra, consciente e inconsciente, eu e os outros, sujeito e
objeto, e assim por diante.
A quebra no par de opostos ! Esse é o dado cultural e civilizatório
mais importante na diferenciação do homem face aos animais: tornamo-nos
capazes de "conhecer a Árvore do Bem e do Mal", tornamo-nos capazes
de co-nhecer a nós mesmos e ao mundo que nos rodeia, tornamo-nos peque-nos
deuses ( e/ou demônios ), cada qual capaz de criar para si mesmo o mundo
em que vive, ou de recriar, através de um ato de percepção
e de "interpretação" o seu próprio habitat, suas
formas, suas concepções, suas fantasias, suas obras, suas realizações.
Neste ato de natureza divina, perdemos a noção de que, o que vemos,
do modo como o vemos ( do modo ao mesmo tempo particular e herdado em que cada
qual o percebe) é fruto de nossa "interpretação pessoal
( e coletiva )" do dado real percebido. Nossa percepção é
historicamente determinada, resultando da acumulação de séculos
e séculos de contribuições de natureza cultural, racial e
familiar. Ela é educada e treinada para "interpretar" de formas
prescritas o que somos - assim como aos outros, aos objetos, situações
etc. Somos sugestionados a acreditar em uma espécie de fofoca muito bem
fundamentada a respeito de nós mesmos e do mundo. De uma maneira inconsciente
limitamo-nos a repetir o que nos é ensinado e percebemos tudo e todos dentro
de uma ótica ao mesmo tempo sentida como pessoal e própria, assim
como coletiva e social. Não nos apercebemos de que estamos e somos unipolarizados,
não nos damos conta do prejuízo de sê-lo, tornamo-nos egocentrados,
específicos, singulares, com todo o universo perceptu-al organizado dentro
de nosso ponto-de-vista aparentemente pessoal e particular. Temos assim explicações
convenientes para tudo e sentimo-nos racionais, lógicos, inteligentes e
coerentes enquanto agimos, pensamos e interpretamos tudo e todos sob nossa ótica
pessoal / coletiva. Banimos de nossas controladas e disciplinadas vidas a dúvida,
a perplexidade, a aventura perante o Desconhecido.
Para completar nosso transe esquecemos de confrontar conti-nuamente nossas diletas
concepções com a REALIDADE VIVIDA e as-sim, não nos damos
conta de que o TODO à nossa volta não está no compromisso
de se submeter às nossas muito PARTICULARES necessidades e limites, sequer
nos damos conta de que os outros, as si-tuações, o acaso e o destino
- e porque não dizer o Universo - não foi avisado de que ele deva
comportar-se direitinho para que não nos sintamos desadaptados, não
nos sintamos em conflito com seus sig-nificados e experiências possíveis
ou imagináveis. Quanto a isto vale a afirmativa:
Se a sua teoria ou modelo explicativo não é capaz de representar
a totalidade das experiências e possibilidades da vida, então...
dane-se a teoria !
Em assim não sendo, esforçamo-nos para estreitar o nosso universo
de experiência, reduzindo-o a alguma coisa menor, mais pessoal, mais controlável
e manipulável, e sobretudo, procuramos manipular e controlar tudo e todos
para conter nosso medo e nos proteger contra o Des-conhecido, o Amplo, o Inconsciente.
Enrijecemo-nos , contristamos nossos músculos, fechamo-nos no "mundinho
familiar" que conseguimos englobar neste esforço, contentamo-nos ou
nos frustramos com nossa criação, ficamos satisfeitos por ter conseguido
o nosso intento (reduzir o incomensurável a algo manipulável) e,
por outro lado, choramos a liberdade perdida: a aventura e a magia da visão
primordial !
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Sobre o autor
Luís Vasconcellos é Psicólogo e atende
em seu consultório em São Paulo.