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Dúvidas do cotidiano - Parte 4

por Flávio Gikovate em Psicologia
Atualizado em 22/07/2009 15:10:56


Como definir uma pessoa má? Trata-se de uma característica inata ou é algo que foi adquirido ao longo dos anos de formação? Como ajudar alguém a evoluir moralmente?
Resposta: Trata-se de uma questão muito complexa, mas eu penso que, para a grande maioria dos casos, a maldade é “filha” da fraqueza. Ou seja, não acredito que existam pessoas que gostem de ser más e se orgulhem disso. Atos maldosos são, quase sempre, derivados de emoções que escaparam do controle da pessoa, especialmente aqueles que dependem da inveja: ao admirar e valorizar algo em outra pessoa, a criatura mais fraca se sente diminuída e humilhada pela presença daquela virtude. Não sendo capaz de se conter, reage violentamente ao que foi sentido como uma agressão – a presença, no outro, da qualidade admirada e não possuída. Pessoas imaturas, egoístas e pouco tolerantes a contrariedades e frustrações é que fazem parte daquelas que chamamos de más, justamente porque investem contra nós sem que tenhamos feito algo de negativo para elas. Reagem com raiva pelo simples fato de sermos do modo como somos e isso lhes mostrar suas limitações e incompetências. É por isso que penso que se essas pessoas egoístas e invejosas conseguirem evoluir emocionalmente, o que implica em aprenderem a tolerar melhor as dores da vida, poderão perfeitamente se tornar criaturas portadoras das virtudes que tanto invejam. Tudo isso faz parte das nossas aquisições ao longo da vida e pode ser alcançado em qualquer idade. A verdade é que os egoístas gostam de mostrar que estão felizes mas não é verdade. Quem está feliz não age de forma agressiva – e gratuitamente – contra ninguém. Pessoa feliz não tem tanta inveja, não é tão insegura e ciumenta. É hora de pensarmos de forma mais séria sobre nossos valores morais e aqueles das pessoas que nos cercam. Uma sociedade que defina de modo mais claro o que são virtudes e o que são vícios ajudará tanto os adultos como suas crianças a evoluírem de forma mais rápida na direção da maturidade emocional e moral, condição fundamental para que as pessoas possam se sentir felizes, orgulhosas de si mesmas e, portanto, menos invejosas. Quem está bem se preocupa menos com os outros, com o que têm ou deixam de ter. Estão mesmo é interessadas em alcançar seus objetivos.

Como posso me aceitar e ter uma boa imagem de mim mesmo quando não consigo gostar de minha própria mãe? O que fazer quando o que sentimos está em franca oposição com o que gostaríamos de sentir? É para aceitar o sentimento ou usar a razão para tentar alterá-lo?
Resposta: Temos que compreender que a razão não tem poderes para alterar nossos sentimentos. Não podemos gostar de alguém por decreto, do mesmo modo que não podemos deixar de sentir inveja quando nos sentimos muito por baixo de uma outra pessoa, raiva quando nos magoam e encantamento quando alguém nos fascina. As emoções humanas têm autonomia e são governadas por uma parte de nossa mente que, como regra, está em franca ligação com a verdade, com os fatos que as determinam. Assim, se uma mãe age de forma destrutiva e, consciente ou inconscientemente, tende a prejudicar a evolução de seu filho ou sua filha, não há como não sentir mágoa dela, o que incapacita o filho de amá-la. Mesmo que sejamos educados na direção de que temos que amar pai e mãe, pois afinal de conta nos geraram e cuidaram de nós na infância, não conseguiremos sentir esse amor se o comportamento materno não estiver de acordo com aquilo que esperamos: dar carinho, proteção genuína, tentar nos fazer crescer e prosperar. Muitas mães são incapazes de contribuir para a evolução de seus filho por temerem que serão abandonadas caso eles se sintam fortes. Essa é uma das contradições da vida que as mães terão que enfrentar: é dever delas contribuir para que seus filhos se tornem livres e independentes delas! Não é nada fácil, de modo que alguns discretos tropeços maternos têm que ser relevados. Agora, não dá para amar alguém que tem por política fundamental nos sabotar e enfraquecer. Há pessoas, não poucas, que são excessivamente preocupadas com a opinião que “os outros” têm delas. Como fazer para não dar importância à opinião alheia a nosso respeito, condição fundamental para nos sentirmos mais livres? Existem, de fato, pessoas assim livres?
Resposta: É claro que existem pessoas capazes de dar menos importância à opinião daqueles com quem convivem. Porém, desconheço alguém que não tenha nenhuma preocupação em agradar seus semelhantes e esteja totalmente desligado e despreocupado com a imagem que irradia. Na verdade, creio que dar alguma atenção à opinião alheia é até bom; vivemos em sociedade e temos que saber como é que as outras pessoas nos vêem, nos avaliam e que sentimentos despertamos nelas. Isso não significa que tenhamos que nos tornar escravos disso a ponto de perdermos totalmente nossa espontaneidade e individualidade. Por outro lado, a preocupação excessiva é indicativo de que nos sentimos particularmente inseguros acerca da nossa capacidade de sermos aceitos do modo como somos. Não acho que seja o caso uma pessoa deixar de ser e de agir de acordo com suas convicções apenas com o objetivo de agradar “os outros” – ou então com o intuito de evitar a inveja deles. A preocupação excessiva tem que ser combatida de modo prático: temos que nos colocar do modo como somos e observarmos as reações que despertamos. Sim, porque muitas vezes temos uma idéia preconcebida de que não seremos aceitos por essa ou aquela peculiaridade e tratamos de escondê-la; o que acontece é que, ao agir assim, nunca mais testamos nossa idéia com os fatos e poderemos nos manter fiel a ela sem que ela seja verdadeira. Por exemplo, podemos nos envergonhar muito de termos determinados medos e tratamos de escondê-los dos nossos conhecidos. Quando criamos coragem e revelamos nossa “fraqueza” descobrimos que não só ela é bem recebida, como ainda induz o interlocutor a confidenciar suas próprias fraquezas. A sinceridade é um excelente ingrediente quando pretendemos agradar nossos pares. Mostrar fraquezas é sinal de força!

Pode acontecer que um homem - ou uma mulher - que esteja bem em seu relacionamento amoroso seja infiel (e várias vezes) sem que isso signifique que se trata de pessoa má, sem valores definidos e que podem agir com deslealdade também em outras áreas da vida?
Resposta: Acho que sim, apesar de que a grande maioria das pessoas que não respeita o direito dos seus pares tende a ter condutas duvidosas também em outras áreas do convívio. Porém, podem existir pessoas, especialmente homens, que tenham sido educados numa atmosfera tal que a vida sexual fora do relacionamento afetivo não implique em nenhum tipo de delito. Aprenderam com seus pais, tios e amigos que se trata de uma prerrogativa masculina, que o sexo é algo que pode e deve ser praticado fora do casamento e que isso não é imoral e nem implica em deslealdade. Esse tipo de atitude quase sempre é censurado por esses mesmos homens quando são praticados por mulheres, suas esposas, filhas ou outras com as quais se relacionem intimamente. Trata-se de uma crença, algo que se toma como certo sem mesmo refletir sobre o tema, algo que aprendemos desde pequenos e nem mesmo nos dispomos a refletir sobre o assunto, pois o consideramos uma verdade em si. É claro que se trata de postura um tanto acomodada, porém ainda presente em muitos homens de bem. Agora, a regra geral é sempre a mesma: quem não é atencioso e preocupado com os direitos dos seus pares em uma área da vida tende a agir de forma similar em outras áreas e também em outros relacionamentos.



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flavio
Flávio Gikovate é um eterno amigo e colaborador do STUM.
Foi médico psicoterapeuta, pioneiro da terapia sexual no Brasil.
Conheça o Instituto de Psicoterapia de São Paulo.
Faleceu em 13 de outubro de 2016, aos 73 anos em SP.

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