CRUZADOS E CAVALEIROS JEDI

Autor Christina Nunes - [email protected]
Facebook   E-mail   Whatsapp


Se você é da minha geração, ou ao menos pertence às três últimas, talvez seja um apreciador da série de filmes de George Lucas, concluída magistralmente com o episódio que acaba de ser lançado no circuito de cinemas, "A Vingança dos Sith". Talvez seja do tipo de pessoa que sente enlevado o espírito diante de Cavaleiros Jedi, e também de Cavaleiros medievais como o Balian, do emocionante "Cruzadas", também no circuito. E por uma razão bem plausível, que já exponho a seguir: identificação fulminante. Em ideologia, em essência do espírito. Mas vamos devagar.

Li outro dia, por conta da estréia da "Vingança...", que, se não me engano em Londres, a adoração pelo universo mítico de George Lucas atingiu um tal extremo que foi criada, pra valer, uma Ordem Jedi. Com documentação e tudo; as pessoas, quando perguntadas em determinadas ocasiões, se identificam como Jedis.

Para quem desconhece o significado disso, por falta de familiaridade com o assunto, explico que um Cavaleiro Jedi é um defensor da ordem e da justiça na galáxia; luta com espadas de luz colorida, em geral azul ou vermelha, e pugna pelo bem da República, o sistema político vigente naquele universo planetário que compõe as duas trilogias cinematograficas; assim como o Balian, de "Cruzadas", é um Cavaleiro que, por nobreza de índole e por distinção, a exemplo do pai, o lorde Godfrey, recusa-se a matar "em nome de Deus" por selvageria e por ganância pura, como era próprio daquela fase sombria na história da humanidade. O pai, antes de morrer, transmite-lhe o lema de honra: lutar sem vender a própria alma, ainda que isto signifique contrariar as ordens do rei sob cujo poder ele serve. O que Balian aplica, fiel e heróico, quando defende Jerusalém dos Sarracenos unicamente para proteger o povo que ali vive, e não pelos seus muros, assim como quando se recusa a participar de um conluio político para derrubar o despótico rei que ali governava, o tirano Guy, e tomar-lhe a esposa por quem, diga-se, havia se apaixonado.

Após assistir "Cruzadas" e "A Vingança dos Sith" fiquei pensando o que arrasta os aficcionados destes temas do cinema a fundar uma Ordem Jedi em carne e osso; identificação, é o que me ocorre, como mencionei acima. E afirmo baseada em testemunho próprio. Porque fica claro, numa auto análise justa e isenta, que muitos devem compartilhar do anseio de que, para cada desmando em grande escala - em escala planetária, diga-se de passagem - que amargamos hoje em dia, existisse um Jedi ou um Balian, que auxiliasse eficientemente a por um fim definitivo, um basta aos graves problemas que sobrexistem ainda em pleno século vinte e um - e note-se que a encrenca em torno da posse de Jerusalém persiste hoje, furiosa e acalorada.

Mais que isso; desejaríamos participar de um tipo qualquer de "Cruzada" justa, ou pertencer a alguma ordem ideológica eficaz, que resgatasse a paz no mundo - a simbólica convivência pacífica entre o povo de Jerusalém e os sarracenos do filme de Ridley Scott, apesar de todas as diferenças. Afinal, é o de que o nosso mundo mais precisa: da compreensão de que é possível o entendimento de que as diferenças entre os povos, entre as pessoas, entre as famílias, podem ser respeitadas, e de que há muito a se aprender de bom com o exemplo "diferente" do outro. Que a guerra é a solução irracional para tudo isso, a despeito das falsas boas razões que se aleguem para justificá-la, e que, em última instância, não resolve nada, senão acrescenta mais problemas de difícil solução - para constatar-se, basta que se observe o exemplo da invasão americana no Iraque.

Refletindo maduramente sobre a questão, penso que talvez façamos parte de algo semelhante sem a devida percepção. Precisamos atentar, contudo, que isto é questão de mera tomada de consciência. A partir do momento em que nos sentimos atuando de alguma forma para contribuir pela melhoria significativa do mundo, já somos , sem nos dar conta, Cavaleiros Jedi, ou versões modernas de um Balian.

Em "Cruzadas", no momento da guerra final pela defesa dos muros de Jerusalém contra a invasão sarracena, o bispo pergunta a Balian: "para esta luta, seriam necessários muitos Cavaleiros; temos poucos. Onde arranjará Cavaleiros para lutar?" - ao que Balian, olhando em torno para a multidão que o respeitava profundamente, aguardando-lhe as decisões, em expectativa, responde nomeando todos os homens prontos a se ajoelharem para prestar o juramento de Cavaleiros, ali mesmo; homens do povo, que, entusiasmados, se apresentam, respondendo-lhe à convocação com legítima lealdade.

Observa-se, com isso, que tudo é questão de atitude, e não de título. Assim como emergiram Cavaleiros às centenas prontos para a luta, em disposição e em intenção, e correspondendo plenamente à confiança que lhes foi depositada por Balian, lutando sem esmorecimento, e com grande heroísmo pela defesa de suas famílias, hoje em dia, sem o sabermos, talvez estejamos fazendo parte de uma nova espécie de Ordem Jedi, ou de um tipo de Cruzada, diferente e mais nobre.

Usando o princípio Jedi do uso correto da "Força" de vontade, oriunda da clareza maior ou menor de espírito da qual já disponhamos, com o profundo respeito pelas diferenças de posição nas quais cada ser se situa neste mundo; nunca utilizando esta "Força" para algo que não seja "defesa e conhecimento", como nos ensina o princípio Jedi; quando, a partir disso, empunhamos simplesmente nossa melhor disposição no dia-a-dia para combatermos o bom combate - nossa espada de luz -, por intermédio do exemplo esmerado para os nossos filhos; ou publicando, num espaço como este, textos inspirados, que visam a melhoria da vida e a disseminação de uma mensagem válida de paz e de amor entre os seres humanos, ou ainda de mil e uma outras maneiras possíveis; na medida da luta de cada hora, estaremos nos consagrando, por mérito, Cavaleiros fiéis da maior causa a ser defendida nos dias em que vivemos: a causa da perseguição, sem desistência, daquele mundo melhor com o qual, ainda hoje, sonhamos, depois da noite de mil anos daquela Idade Média, que tantos males ocasionou ao pensamento humano, e após tantas outras guerras inglórias desde então. Na certeza de que, em mantendo acesa a chama, com o nosso esforço nesse sentido, o mais importante acontece: outros virão, e assumirão a luta grandiosa, numa conquista progressiva, até o dia em que, todos juntos, celebraremos a vitória final: a materialização satisfatória do chamado "Reino dos Céus", habitando, simultaneamente, tanto dentro como fora de nós, para a felicidade e o bem maior de todos.

Com amor,
Lucilla e Caio Fábio Quinto
"Elysium"
https://www.elysium.com.br

Texto revisado por Cris

Gostou?    Sim    Não   

starstarstarstarstar Avaliação: 5 | Votos: 83



Compartilhe Facebook   E-mail   Whatsapp
foto-autor
Conteúdo desenvolvido por: Christina Nunes   
Chris Mohammed (Christina Nunes) é escritora com doze romances espiritualistas publicados. Identificada de longa data com o Sufismo, abraçou o Islam, e hoje escreve em livre criação, sem o que define com humor como as tornozeleiras eletrônicas dos compromissos da carreira de uma escritora profissional. Também é musicista nas horas vagas.
E-mail: [email protected] | Mais artigos.

Saiba mais sobre você!
Descubra sobre Autoconhecimento clicando aqui.