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As mulheres e as romãs...

por Adília Belotti em Autoconhecimento
Atualizado em 04/08/2006 12:45:15


Surpresas são uma delícia! Uma amiga chega com o livro Sopa de Romãs, da autora iraniana Marsha Mehran. Diz que a combinação de histórias, cozinhas mágicas onde fervem caldeirões de aromas exóticas e emoções temperadas de fantasias, tinha tudo a ver comigo... amigas são assim, espelhos generosos de nós...

Nina Horta fez a saborosa tradução do livro e adaptou as receitas que vão pontuando a narrativa costurada com as cores da tal cozinha mágica: dourados de samovares antigos, anil de ladrilhos e vermelhos... de romãs.

Romã aqui para nós é frutinha de quintal, daquelas que não vão pra mesa de festa, ficam no pé, ao sabor das crianças e dos passarinhos... no Dia de Reis lá em casa, faziam parte do ritual de prosperidade que incluía comer um bago, escolher seis sementes, jogar o resto para trás e guardar as sementes secas na carteira até o ano seguinte.

Romãs são símbolos tradicionais da fecundidade, em alguns lugares da Ásia a fruta aberta representa a própria vulva. Na Grécia, era a fruta de Afrodite, a deusa do amor e da beleza e de Hera, a deusa que regia os casamentos e os partos. Também é parte de um dos mitos mais antigos e mais profundamente relacionados aos mistérios femininos. A história de Deméter e de sua filha, Perséfone.

A bela e jovem Perséfone, filha do poderoso Zeus e de Deméter, a grande deusa da Natureza, colhia flores junto com as Ninfas, na planície de Ena, sob o sol da primavera na Sicília. Tão linda e tão iluminada em sua juventude que Hades, senhor do mundo subterrâneo se apaixonou perdidamente por ela. E lá estava então a moça, na campina florida quando reparou em uma flor estranha, bela e de perfume desconhecido, irresistível, um narciso, na verdade, mas da espécie que só floresce nos sonhos. Maravilhada, a moça se afastou das companheiras querendo aproximar-se do tufo de cores que, aparentemente, só seus olhos viam. No momento em que se abaixou para colher a flor magnífica, no entanto, a terra abriu-se sob seus pés e de suas entranhas ela viu emergir o carro negro puxado por quatro cavalos selvagens e igualmente negros do Senhor das Trevas, imponente, belo e terrível. E num segundo, Perséfone, mergulhada em encanto e terror, é raptada e levada para as profundezas do reino de Hades - ou Plutão.

Raptos não chegavam a ser incomuns naqueles tempos, mas Hades talvez tenha subestimado sua futura sogra. Deméter, inconformada com a partida da única filha, refugiou-se na tristeza e deixou de cuidar da terra, que cobriu com sua própria desolação. A história das peregrinações de Deméter em busca de Perséfone é longa e tão obstinada que Zeus, vendo as sementes murcharem antes de germinar e os campos mergulhados num inverno estéril e sem fim, resolveu intervir. Comandou a volta de Perséfone da mansão de Hades, mas a ordem chegou quando já era tarde...

Hermes ou Mercúrio, o mensageiro de Zeus chegou ao mundo dos mortos para fazer cumprir os desejos do grande deus e encontrou Hades, magnífico, e a bela Perséfone juntos, sentados em imensos tronos negros de ébano. Antes de deixar a noiva partir, Hades deve ter murmurado ao seu ouvido palavras ardentes e ofereceu-lhe numa bandeja de delícias, uma romã, que a jovem provou, encantada e sem saber que nem mesmo Zeus poderia tirar do mundo subterrâneo uma criatura que tivesse bebido ou comido algo de lá. Foram seis gominhos de romã que tornaram a jovem para sempre Senhora do Reino das Sombras, ao lado de seu terrível e poderoso marido.

E foi assim que Deméter, bondosa mãe da Natureza, teve que resignar-se a ter a filha junto de si apenas por alguns meses no ano, sempre ao findar do inverno, quando Perséfone chegava iluminada, carregando nos pés a Primavera, mais uma vez... e foi assim também que as criaturas tiveram que se acostumar com o ritmo circular do tempo, com o eterno germinar das sementes, do caminho de todas as coisas do escuro para a luz e de volta, sem parar...

Romãs... quem diria...tem tudo a ver conosco...
Para ler: Sopa de Romãs, Marsha Mehran, editora Jaboticaba, tradução de Nina Horta.


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adilia
Adília Belotti é jornalista e mãe de quatro filhos e também é colunista do Somos Todos UM.
Sou apaixonada por livros, pelas idéias, pelas pessoas, não necessariamente nesta ordem...
Em 2006 lançou seu primeiro livro Toques da Alma.
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