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Uma mente acelerada é uma mente desequilibrada

por Bel Cesar em Espiritualidade
Atualizado em 26/05/2006 12:45:09


Sábado, dia 13 de maio de 2006, inauguramos a hospedagem e o gompa (sala de meditação) do Sítio Vida de Clara Luz, com a presença de Lama Michel. Éramos um grupo de mais ou menos cento e cinqüenta pessoas. Por quase uma hora, sentados na grama ao redor das estátuas dos Cinco Dhyani Buddhas, ouvimos os ensinamentos de Lama Michel sobre a relação entre a mente, o corpo e o meio-ambiente. O sol estava suave, o céu azul com poucas nuvens. Todos estavam naturalmente atentos e silenciosos. O bem-estar geral era notório. Podia-se reconhecer no grupo a presença de duas qualidades que evidenciam a total ausência de ansiedade: o equilíbrio, a mente atenta ao momento presente e a espontaneidade amorosa.

Esta experiência de calma e satisfação tornou-se contrastante dois dias depois quando vivenciamos, em São Paulo, um dia de susto e intenso alarme com a rebelião dos presos. Neste dia, o mal-estar geral era notório!

A partir destas situações tão contrastantes, podemos compreender de modo mais profundo o quanto nosso Sistema Nervoso Central (nossa mente) necessita de uma situação de conforto e de segurança para usufruir a sensação de repouso e de bem estar!

Quando nossa percepção torna-se alerta para uma situação de ameaça, surge a ansiedade. Ela é decorrente de uma descarga de noradrenalina, um neurotransmissor produzido nas supra-renais que nos ajuda a focar a atenção para a defesa. Enquanto nos preparamos para fugir, há um aumento do cortisol e da adrenalina. No entanto, assim que o susto passar, estes hormônios irão cair e surgirá um aumento de serotonina para reconstituir o bem-estar. Portanto, um corpo equilibrado sabe lidar tanto com as situações de ameaça como as de repouso. Mas infelizmente a maioria de nós perdeu esta habilidade porque vive em constante estresse!

Não podemos nos esquecer que evolutivamente faz muito pouco tempo que saímos dos tempos da caverna. Naquela época era positivo ser ansioso, pois a ansiedade era um sinal de alerta diante do perigo iminente, com a função de capacitar na tomada das medidas necessárias para enfrentar a vida. A excitação do Sistema Nervoso Central era necessária para estimular o nosso corpo, fosse para lutar ou para fugir.

No entanto, o que interpretamos hoje como ameaçador transcende e muito o perigo de vida biológico. Hoje em dia, o simples receio de perder conforto, poder econômico, afeto ou mesmo privilégios já são fatores suficientes para desencadear o estado ansioso! Quando há um desequilíbrio emocional, até mesmo o simples contato com o novo ou com situações inesperadas já é suficiente para gerar ansiedade.

A ansiedade é uma forte sensação de incômodo e inquietude que surge quando o futuro nos parece ameaçador. Quanto ela se torna intensa, pode provocar diferentes sintomas para cada pessoa: falta de ar, taquicardia, suores, problemas digestivos (prisão de ventre, enjôos, gases), fome exagerada ou até mesmo ausência de fome.

Os medos que surgem durante um ataque de ansiedade costumam ser irracionais e sem sentido. Segundo o psiquiatra Dr. Sergio Klepacz, quando nos sentimos sozinhos, o imaginário tem mais efeito sobre o corpo do que a própria realidade!

A ansiedade aumenta na medida em que surgem exigências conflitantes e paradoxais. Isto é, quando queremos e não queremos uma mesma coisa ao mesmo tempo! Por exemplo, às vezes queremos muito fazer algo, mas acabamos por ficar ansiosos ao querer fazê-lo de modo muito perfeito. Devido ao medo de errar, nos sentimos incapazes de agir e acabamos por perder nossa vontade inicial. Assim, já não queremos mais realizar o que gostaríamos de fazer tão bem feito... A ansiedade nos rouba o prazer da realização.

Às vezes nem nos damos conta de que estamos ansiosos. Isso ocorre porque estamos ligados no piloto automático e agimos sem ter consciência do que estamos pensando e sentindo. Nossa mente está solta, inquieta, perdida em pequenas fantasias irreais que roubam nossa energia vital e estabilidade emocional. Nestes momentos, corremos o risco de retro alimentar nossos medos e dúvidas como uma bola de neve que cresce à medida em que o tempo passa. Até que nosso coração e respiração se aceleram, e podemos nos surpreender tendo um ataque de pânico!

A ansiedade surge à medida que alimentamos suposições que antecedem o futuro. Sejam boas ou más, as fantasias nos impedem de lidar com a realidade: na imaginação perdemos a habilidade de lidar com o tempo real dos acontecimentos. Desta forma, sofremos antes do tempo ou idealizamos a felicidade como o milho pendurado na frente do burro que o estimula a não parar de andar! Ter consciência de nosso próprio ato imaginário pode, por si só, nos ajudar a superar a ansiedade.

Cabe ressaltar que é benéfico pensar sobre o futuro. Planejar não é sonhar, mas sim gerar metas e estratégias que nos orientam no momento presente.
Imaginar problemas futuros pode servir de base para reflexões importantes sobre o que devemos evitar. No entanto, prever uma dificuldade não quer dizer vivê-la por antecipação. A ansiedade surge quando nos desconectamos da realidade imediata.

Quando estamos ansiosos nossa mente fica mais acelerada e numa tentativa insólita buscamos viver antecipadamente o futuro que ameaça nosso equilíbrio por meio dos pensamentos. Queremos desesperadamente vivenciar os acontecimentos futuros como forma de amenizá-los! Mas sabemos que este esforço é em vão.

Segundo pesquisas médicas, uma pessoa poderá ter uma tendência maior para a ansiedade quando houver uma predisposição genética em sua família. Nestes casos as manifestações podem ser bastante precoces: nota-se desde cedo que a criança é hiperativa, chora com facilidade e tem dificuldade para dormir. Uma criança ansiosa tem mais dificuldade de incorporar situações novas ou de lidar com o desconhecido. Afinal, o conhecido sempre traz a sensação de segurança e controle.

Ficar momentaneamente ansioso é uma reação normal, necessária para ativar nossas forças e defesas diante da conquista do novo. No entanto, quando a ansiedade nos impede de pensar e agir de forma construtiva, é necessário buscar ajuda terapêutica.

A ansiedade normal não é generalizada, pois ela se restringe a uma determinada situação, que diminui à medida que a pessoa se adapta a ela, mesmo que a situação se mantenha desconfortável. Segundo tratados médicos, se uma pessoa permanecer apreensiva por um período superior a seis meses, ainda que tenha um motivo para tanto, deve buscar ajuda médica, pois o transtorno de ansiedade generalizada pode tornar-se crônico. As mulheres são duas vezes mais acometidas pela ansiedade generalizada do que os homens. Como vimos, a principal característica psíquica do estado ansioso é a aceleração do pensamento, como se estivéssemos elaborando a maneira mais rápida de nos livrarmos do perigo. No entanto, a mente acelerada torna-se confusa, desequilibrada, sem clareza para agir. Definitivamente, com a mente acelerada não conseguimos agir de modo construtivo.

Nestes momentos, o melhor é parar de seguir os pensamentos e observar o corpo. Aliás, é melhor aceitar conviver com a insegurança quando ela surge. Não adianta ter pressa em querer se livrar dela. Quanto menos resistência tivermos em reconhecê-la, melhor poderemos sentí-la em nosso corpo, e desta forma, poderemos fazer algo por nós. A ansiedade é assim: quanto mais tentamos nos livrar dela, mais ela se instala em nós.

Portanto, para a ansiedade diminuir, é preciso inicialmente diminuir a atividade mental. Só então poderemos recuperar a sensação de calma. No entanto, enquanto não formos capazes de desacelerar nossa mente, é melhor aceitarmos nossa falta de controle e buscar por ajuda terapêutica. Pois não adianta forçar a mente, isto é, querer ir além de nossas capacidades.

Uma atitude importante para superar a ansiedade é voltar a atenção para o corpo: tomar consciência de qual parte de nosso corpo está sendo paralisado por esta emoção. Então, cuide do corpo, seja massageando-o ou mesmo respirando algumas vezes profundamente, levando toda a sua atenção a esta região. Ao respirar lentamente, iremos desacelerar fisiologicamente o cérebro e por conseqüência a mente.

Uma técnica muito simples, porém eficaz, é a de visualizar a forma, a cor, a textura, a densidade, o peso e até mesmo o cheiro e o sabor desta tensão. Em seguida, pense intuitivamente na cor capaz de eliminar este ponto de energia paralisada em seu corpo. Inspire e na expiração imagine que esta cor penetra como um raio laser destruindo todo este complexo de energia parada.

Depois, sinta a diferença. Movimentar um pouco todo o nosso corpo também é muito bom. Bocejar, emitindo um som amplo e espontâneo é excelente para soltar qualquer energia parada. Por fim, devemos nos concentrar num ponto à nossa volta. Trazer nossa atenção para algo que nos chame atenção. Só então, quando estivermos centrados, poderemos fechar novamente os olhos e voltar a lembrar o que estava nos deixando ansiosos. Mas desta vez, sabendo que o susto passou, poderemos nos manter conscientes de nossa capacidade de avaliar e refletir: “OK, para onde mesmo que estava me levando?”. É possível de até nos surpreendermos com vontade de rir de nós mesmos...



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bel
Bel Cesar é psicóloga, pratica a psicoterapia sob a perspectiva do Budismo Tibetano desde 1990. Dedica-se ao tratamento do estresse traumático com os métodos de S.E.® - Somatic Experiencing (Experiência Somática) e de EMDR (Dessensibilização e Reprocessamento através de Movimentos Oculares). Desde 1991, dedica-se ao acompanhamento daqueles que enfrentam a morte. É também autora dos livros `Viagem Interior ao Tibete´ e `Morrer não se improvisa´, `O livro das Emoções´, `Mania de Sofrer´, `O sutil desequilíbrio do estresse´ em parceria com o psiquiatra Dr. Sergio Klepacz e `O Grande Amor - um objetivo de vida´ em parceria com Lama Michel Rinpoche. Todos editados pela Editora Gaia.
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