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O Administrador da Dor - Parte 3

por Luís Vasconcellos em Psicologia
Atualizado em 01/04/2005 12:41:01


O Administrador da Dor é uma função psicológica importante. Ele é aquela parte racionalizadora em nós, que teme a dor, o sofrimento, a morte; assim como a perda, o revés, a rejeição, o fracasso, o inesperado e, mais do que tudo, ele barganha com o próprio Deus e com todas as situações e pessoas do mundo, para garantir alguma proteção e segurança básica.

Quando o AdmDor extrapola as suas naturais prerrogativas - como função psicológica - ou seja, quando ele está exagerado e desequilibrado, ele acaba causando uma espécie de "ruptura" entre a nossa consciência individual e o nosso processo vital, ou seja, uma separação entre nós mesmos e a natureza (O Inconsciente!) que há em nós.
Se eu der ao termo "natureza em nós" o nome de Inconsciente, então se conclui que esta ruptura nos rouba o que há de mais essencial e de mais vital em nosso viver: a conexão com o plano psicológico.
Neste contexto de ruptura ocorre que ficamos sem nosso senso de orientação pessoal, fazemos o que não desejamos e deixamos de fazer o que desejamos. De qualquer modo, sempre resta o sofrimento e a frustração.

Podemos viver uma vida ilegítima – facilmente - pois podemos sucumbir às formidáveis pressões, tanto externas quanto internas e, desorientados, sem consistência em nossa vontade pessoal, acabar sucumbindo ao sem-sentido de uma existência sem sonho pessoal, sem meta e sem um objetivo verdadeiramente pessoal.
Qualquer um (divorciado de Si Mesmo) pode sofrer por não ter dito (ou feito) alguma coisa, em consonância com o que o seu “coração desejou”...
Contudo temos que conferir e observar que podemos sofrer muita frustração, tanto por NÃO FAZER o que desejamos, quanto por FAZER o que NÃO desejamos...

Como sabemos, há muitos modos de errar e é sempre muito mais fácil destruir do que construir.
No seu caso, como no meu e no de qualquer um, há a necessidade de examinar as circunstâncias nas quais a desconexão se produziu e ao mesmo tempo aumentar a sintonia com o próprio íntimo.

Isto só se consegue trabalhando a consciência individual para que ela se fortaleça em face do AdmDor. É preciso sair deste estado de consciência que mereceria o nome de “transe mecânico / repetitivo” (e absolutamente circunstancial!).

Apenas como UM exemplo (dentre os milhares possíveis!), vamos imaginar (e dramatizar!) uma pessoa vivendo uma situação em que um dos pais sempre fazia comentários irônicos de desprezo quanto ao seu talento para desenho (ao invés do desenhar, poderia ser o ato de jogar, o de falar, o de dançar e/ou qualquer outro ato ou expressão pessoal!)
Se a situação apontada acima gerou um sofrimento (especialmente se o nosso exemplificado “amigo” sofreu rejeição depois de trabalhar intensamente em uma “obra pessoal”!) podemos facilmente imaginar esta pessoa EVITANDO DESENHAR O QUE QUER QUE SEJA, PARA O RESTO DE SUA VIDA, pois uma das características do Administrador da Dor é a sua rigidez e fixidez, na medida em que adaptações novas não são mais possíveis.
Podemos imaginar a tensão da pessoa em questão se alguém lhe pede para desenhar algo no trabalho ou na escola.
Fica automaticamente excluída a profissão de desenhista ou de artes visuais já que o Administrador da pessoa a fará evitar tais situações por todos os meios possíveis e imagináveis, para todo o sempre...
Fica excluído qualquer brinquedo que inclua desenhar ou pintar.
Naturalmente tudo depende de que o “agir desenhando” tenha se tornado motivo de vergonha ou inadequação. Sem um componente, digamos, trágico, o AdmDor não se instala e não se efetivam as conseqüências acima descritas.

Neste exemplo fica claro que o AdmDor pode ter uma ação corrosiva em qualquer nível, inclusive o nível das expectativas e dos desejos. A adaptação à realidade fica comprometida, o poder de decisão e de escolha fica prejudicado e assim por diante.
Ao dicotomizar, ao radicalizar seus pontos de vista, qualquer pessoa acaba criando um racha psicológico terrível e este nos causa sofrimento mais do que o evita...
Isto deveria servir como apelo à necessidade desta nossa reflexão, pois se o AdmDor é eficaz ele devia evitar a dor e não causá-la.

É preciso sair de um funcionamento psicológico preso ao passado (nosso maior medo é o da REPETIÇÃO DO PASSADO frustrante ou doloroso!) e, para tanto, é necessária, se não imprescindível, a presença atenta de uma outra consciência, de preferência mais desperta, para que consigamos quebrar os "círculos viciosos" nos quais nos enredamos ao longo de anos de falta de sintonia com o Si-mesmo.
Esta “sintonia” ou “ressonância” é justamente o que se espera de uma psicoterapia que movimente os processos do ego na direção de uma integração da mente consciente com o inconsciente. Esta simples conexão, uma vez reconstruída, abastece o ego de novidades e soluções para os mais variados desafios, devolvendo a aventura de viver e a liberdade de escolher a direção de seus passos na caminhada da vida.
Não há como descrever algo tão grande com tão poucas palavras.

É frustrante você só se repetir dia a pós dia. É terrível, pois você descobre-se apequenado e sua auto-estima só se pode construir mediante esforços e adaptações, pois a frustração - que uma postura tímida traz - está sempre presente e precisa ser afastada para não contaminar as seguranças fracamente estruturadas por toda uma vida de rotinas e repetições.

Ao fazer a repressão e a censura achamos que algo foi resolvido e esta ilusão afasta a possibilidade de re-elaboração da decisão de nos afastarmos dos estímulos, pessoas ou situações que nos venceram e que nos feriram.
Temos mais medo da repetição do passado do que realmente um medo do novo, do futuro ou do desconhecido.

Neste sentido, estamos todos, indistintamente “no mesmo barco”:
Percebemos e perseguimos um sentido ou então estamos miseravelmente vazios e inseguros, com baixa auto-estima e temerosos, no que se refere à expressão legítima de nosso potencial.
Podemos estar alijados de nosso destino maior: o de sermos uma consciência espiritual, por um lado e, por outro lado, uma consciência materializada.
O impulso de sonhar, o de ter esperança e o de desejar o possível (e também o aparentemente impossível!) são impulsos de crescimento absolutamente naturais em nós, não precisam ser intencionados, pensados e nem buscados longe de nós, pois são parte integrante de nosso existir psicológico natural.
Só quando pensamos assim a vida pode se revestir de um sentido e uma finalidade. Quem nega esta evidência está, de algum modo, deprimido. O AdmDor – por conta de seu típico funcionamento - é muito mais uma função psicológica ligada à consciência materializada e, devido a isto, serve muito pouco ao desenvolvimento psicológico/espiritual.

Estamos nesta vida para APRENDER! Ou seja, para uma “jornada” cujo ponto de partida é a inconsciência, a imaturidade e a falta de sentido e cuja meta, o ponto de chegada, é a consciência plena, a maturidade e a sabedoria, então não estamos completamente felizes ainda que tudo possa nos parecer “sob controle”.
Quando presos e circunscritos ao funcionamento do AdmDor nós acreditamos que já sabemos quase tudo que há para se saber...
Quem segue inconscientemente o discurso do seu AdmDor acaba nunca “tendo tempo” para realizar um desejo ou impulso.

O ADMININSTRADOR DA DOR faz sempre um adiamento do dia em que a consciência individual será autorizada (ou terá o direito!) a funcionar.
Quase nada - que envolva energia psíquica - é atendido prontamente, pois o AdmDor só sabe atender às pressões externas e quase sempre ignora/reprime/censura as pressões internas ou íntimas.
Por conta de administrar a fuga do sofrer o AdmDor acaba induzindo qualquer um de nós a um igual afastamento das oportunidades de prazer, especialmente se elas demandam algum risco ou incerteza. Deste modo acabamos tendo que nos contentar com uma vida “MAIS ou MENOS”, ou seja, sem grande dor, mas também sem grande prazer, uma vida MÉDIA; sem graça, tediosa, monótona e, sobretudo, absolutamente previsível.

A Realização pessoal é SEMPRE adiada... Claro, desde que aceitemos este discurso interno, sem nos darmos conta de que é apenas isto: um discurso interno ou internalizado...

O AdmDor se caracteriza por ser um “discurso” na mente de cada um e, o que é pior, cada um de nós acredita que o pensamento do AdmDor - o seu “discurso” - constitui o nosso próprio pensamento.
Na verdade, estes “pensamentos” são COMPOSTOS de uma enorme quantidade de VALORES e CONCEITOS adquiridos ao longo da vida.
O que acontece é que, inconscientemente, nos IDENTIFICAMOS com o seu conteúdo e tomamos como NOSSO este discurso.
Um dos meios mais eficientes para conseguir RELATIVIZAR o AdmDor (e reduzir sua dominância exagerada!) é emprestar a ele uma VOZ (em nosso íntimo).
O ato de emprestarmos a ele uma voz constrói uma situação psicológica, ou seja, uma cena psíquica, onde existe o AdmDor e existe a consciência individual. Existe o que quiseram fazer de mim e existe um EU que decide o que fazer com o que quiseram fazer de mim.
Deste modo cria-se um processo através do qual podemos nos diferenciar gradativamente do Administrador da Dor.

continua...



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luis
Luís Vasconcellos é Psicólogo e atende
em seu consultório em São Paulo.



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