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Sexo Como Prazer

por Flávio Gikovate em Psicologia
Atualizado em 09/12/2002 11:51:18


Tenho apontado vários motivos que vêm impedindo as mulheres de desenvolverem uma postura prazerosa e gratificante em relação ao sexo. A questão do prazer deve ser entendida também pelo ângulo mais geral, no qual também são afetados os homens. Nossa cultura não é muito simpática à idéia do prazer, que sempre está associado a conceitos moralmente duvidosos, como futilidade, ócio e egoísmo. Crescemos cercados da noção de que o prazer não é uma virtude, mas um vício. As qualidades morais estão do outro lado do meio-termo. São: o sacrifício, a generosidade etc.

Acredito que vários componentes participaram dessa construção moral que privilegia as dores e deprecia os prazeres. O primeiro deles está ligado ao que é mais difícil: a busca do prazer é a resposta natural de qualquer criança, ao passo que abrir mão dele implica um processo mais sofisticado, que leva tempo para ser atingido. Depois, há uma luta permanente do ser humano no sentido de ser mais do que um animal. O homem é capaz de abrir mão de um direito seu em favor de outra pessoa, o que faz da generosidade uma aquisição muito especial.

Mais que depressa, a vaidade participa desse processo, de modo que a pessoa se sente superior e poderosa ao ser capaz de rejeitar. Surge, então, um novo deleite: a renúncia aos prazeres determina o prazer da renúncia! Dessa forma, as pessoas que perseguem o prazer acabam sendo vistas como fúteis e sem nenhum tipo de sofisticação moral. Mesmo que o façam respeitando os plenos direitos das outras pessoas.

Nossa cultura interfere também naqueles aspectos íntimos. O sexo foi, por um longo tempo, censurado ao ser exercido de modo solitário, na masturbação. É óbvia a interferência de princípios reguladores desnecessários em nossa vida íntima. Afinal de contas, é difícil imaginar algo mais inofensivo do que a masturbação acompanhada de qualquer tipo de fantasia erótica. Aliás, as simples fantasias já não são muito bem vistas.

Sabemos, porém, que nossa concepção a respeito do assunto vem mudando nas últimas três décadas, apesar de ainda serem fortes as influências dessa mentalidade que se opõe ao prazer. A oposição aos prazeres sexuais, em particular, é a mais dramática e terrível de todas. Estou me referindo justamente à busca desse prazer sem nenhuma finalidade: não como prova de amor, nem com o objetivo de dar satisfação ao parceiro. O maior crime é exatamente o de gostar do sexo. O sexo, segundo essa visão moralista tradicional, seria menos pecaminoso se estivesse a serviço de alguma finalidade. Como puro prazer sempre foi visto como vulgar, especialmente quando é exercido por mulheres.

Talvez possamos agora refletir mais profundamente sobre a importância que a prática do ficar, criada pelos nossos adolescentes, tem. Eles estão nos ensinando que é possível a troca de carícias eróticas apenas pelo prazer, mesmo depois da sexualidade adulta. Gostar do sexo por si só está deixando de ser pecado. Pena que outros fatores perturbem, especialmente nas moças, esse processo libertário que é o ficar.


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flavio
Flávio Gikovate é um eterno amigo e colaborador do STUM.
Foi médico psicoterapeuta, pioneiro da terapia sexual no Brasil.
Conheça o Instituto de Psicoterapia de São Paulo.
Faleceu em 13 de outubro de 2016, aos 73 anos em SP.

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