CONFISSÕES DE UM ANDARILHO
Descia calmamente pela estrada afora
Numa manhã cheirosa e tranqüila
Enquanto a mãe no alpendre orava
Na ânsia por observar o filho partindo
Ia molemente o olhar cravado nos sonhos,
As mãos crispadas e os pensamentos em desalinho
No peito, bate o coração aflito
E na visão a poeira da dúvida sobe e lhe domina
Sonhador! Isto ele é como ninguém
E mesmo sem nada saber da vida
Pouco levando no embornal, nenhum vintém
Pisa firme e forte a terra e os medos
- Vou para esta Terra de homens, desabafa
Tirando do corpo o peso das mãos maternas
Finalmente estou livre e solto
Sem as nódoas do berço, nem as algemas da infância
Leva nas mãos e no coração um talento
Que conquistou em eras outras, no além
Fala com as andorinhas, ouve a voz das águas
Tem idéias e sonhos como ninguém
Foi um pássaro cantador que me revelou, diz enfático!
Enquanto voejava livre e solto pelas campinas:
- Vá, diz a voz misteriosa, teu destino é sonhar e curar
Tire, com seu poder, dos homens o choro e o lamento.
Curar o que e porquê, se sofro a cada dia?
Meu canto e sonhos, findam na noite
Sob o látego da pobreza, meu austero açoite,
Dominado por um medo que me assedia.
Hoje sigo meus sonhos, levando nas mãos
A certeza de que o pássaro futurista estava certo
Hei de reaver o meu talento de artista
Que conquistei e esqueci no além, em outras eras
E lá bem longe, da poeira e dos clamores
De minha mãe e dos medos de menino
Conquistarei universos e espaços nunca visitados
Curando e revivendo os sonhos de criança
Feito andorinha, quando em alguém eu pousar
As mãos e o olhar pleno de divinos poderes
Atrairei do além a força dos augustos seres
E darei, sim, eu darei a todos o direito de sonhar.
WILSON FRANCISCO
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