HEDONISMO
Eu li em um dos livros do Ruy Castro que, ainda mais legal do que unir o útil ao agradável, é unir o agradável ao agradável.
Uma idéia carioquíssima. A exaltação do desfrute.
Há tempos venho ruminando sobre isso. Conheço muitas pessoas que vão ao cinema, a boates, a restaurantes e parecem eternamente insatisfeitas.
Até que li uma matéria com a escritora Chantal Thomas na revista República e ela elucidou minhas indagações internas com a seguinte frase:
"Na sociedade moderna há muito lazer e pouco prazer".
Lazer e prazer são palavras que rimam e se assemelham no significado, mas não se substituem. É muito mais fácil conquistar o lazer do que o prazer.
Lazer é assistir a um show, cuidar de um jardim, ouvir um disco, namorar, bater papo. Lazer é tudo o que não é dever. É uma desopilação.
Automaticamente, associamos isso com o prazer: se não estamos trabalhando, estamos nos divertindo. Simplista demais.
Em primeiro lugar, podemos ter muito prazer trabalhando, é só redefinir o que é prazer. O prazer não está em dedicar um tempo programado para o ócio.
O prazer é residente. Está dentro de nós, na maneira como a gente se relaciona com o mundo.
Chantal Thomas aborda a idéia de que o turismo, hoje, tem sido mais uma imposição cultural do que um prazer. As pessoas aglomeram-se em filas de museus e fazem reservas com meses de antecedência para ir comer no lugar da moda, pouco desfrutando disso tudo.
Como ela diz, temos solicitações culturais em demasia. É quase uma obrigação você consumir o que está em evidência. E se é uma obrigação, ainda que ligeiramente inconsciente não é um prazer.
Complemento dizendo que as pessoas estão fazendo turismo inclusive pelos sentimentos, passando rápido demais pelas experiências amorosas, entre elas o casamento.
Queremos provar um pouquinho de tudo, queremos ser felizes mediante uma novidade.
O ritmo é determinado pelas tendências de comportamento, que exigem uma apreensão veloz do universo.
Calma!
O prazer não está em ler uma revista, mas na sensação de estar aprendendo algo.
Não está em ver o filme que ganhou o Oscar, mas na emoção que ele pode lhe trazer.
Não está em faturar um garoto(a), mas no encontro das almas.
Está em tudo o que fazemos sem estar atendendo a pedidos.
Está no silêncio, no espírito, está menos na mão única e mais na contramão.
O prazer está em sentir.
Uma obviedade que merece ser resgatada.
Antes que a gente comece a unir o útil com o útil, deixando o agradável pra lá.
ERNESTO VENTURA
Recebido de Tânia Polo
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