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Papel-Presente - Reflexão para o Dia dos Namorados

Papel-Presente - Reflexão para o Dia dos Namorados
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Discordo quando escuto a afirmação, em tom melancólico, de que o casal se separou porque a paixão virou amizade. Confesso que sinto inveja desse casal. Ruim é quando a paixão termina em nada. Nem carvão, nem cinzas, coisa alguma. Nenhuma carícia que restaure a confiança. Nenhuma lembrança de ternura. A amizade é uma paixão recatada, o pudor de não ofender com palavras incertas. Uma paixão abençoada debaixo de quadros, meticulosamente escolhidos, pregados com esmero para abaixar os telhados. É motivo de pena a paixão que não se transforma, que não deixa o quarto para a sala, que permanece um acordo sexual de provocações, que não se dobra sequer um momento para dormir defeitos. Uma paixão só virtudes e encontros esporádicos. Uma paixão apenas com o lado bom, servil, sem personalidade. Uma paixão enquanto satisfação da hora.

A amizade é amor, podem discordar, não acreditarei. Sinceramente me emociono ao testemunhar um casal de velhinhos, andando com a plumagem das roupas, devagarinho, cuidadoso para não acelerar o passo, cuidadoso com as dores, cuidadoso com os hábitos, capaz de discordar do mundo para proteger a memória. Quantas angústias, quantas vezes ambos cederam para permanecer juntos, quantas juras fizeram e renovaram no leito, quantas telas de abajur colaram no rosto um do outro, de repente pela noite, para acalmar o medo? E não se enjoaram e não se enojaram da intimidade. Não fugiram do compromisso de se entenderem até o fim, do pacto de abrir a janela como quem busca manteiga na geladeira. É possível enxergá-los em silêncio durante uma manhã inteira, cada qual fazendo as suas coisas. E que silêncio! Um silêncio de compreensão que não se encontra em nenhuma igreja. Um silêncio de horta, não de túmulo. Um silêncio espesso de cristal, não de vidro. Eles não praguejam o tempo, sábios e serenos. Porque o tempo não torna os casais apagados - isso é um engano. O tempo não mata a relação - isso é um engano. O tempo não amortece a guarda - isso é um engano. O tempo enobrece a aparência, dignifica os degraus. Escurece o papel em pedra e aclara a pedra em tesoura. Um casal de velhinhos é o amor mais ofensivo que posso descobrir na vida. Suas gavetas são forradas de papel-presente.

Por: Fabrício Carpinejar
https://www.fabriciocarpinejar.blogger.com.br


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