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UMA GOTA FEITA OCEANO

UMA GOTA FEITA OCEANO
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Do vasto oceano uma pequena gota destacou-se do todo, deixando o leito único de uma consciência que ela personificava na unidade de todas as coisas. Subiu depois até uma nuvem que a transportou a uma montanha de arribas escarpadas onde a pequena gota caiu sobre a forma de chuva, despertando na nascente da serra. E ali foi o princípio...

Ignorando a sua existência anterior, a gota julgou ter nascido na montanha. Por momentos, enquanto saltitava nas pedras arredondadas da cascata, nada compreendeu do lugar onde se encontrava, até que desaguou nas águas calmas de um pequeno lago. Aquele era um lugar de grande paz e harmonia.

No princípio, na inocência de quem acabou de nascer, a pequena gota julgou que a vida era toda ela um paraíso; que aprender era ficar nas águas calmas do lago onde nada lhe faltava, pois tudo era criado à sua imagem. Mas um dia alguém disse-lhe que teria que deixar aquele mundo de paz e encarnar num outro mundo mais difícil onde iria aprender muitas das lições da vida. A pequena gota ficou satisfeita com aquele novo desafio, julgando que tudo não passaria de um jogo, de uma brincadeira; quão inocente era, ainda, a nossa pequena gota.

E assim foi lançada na corrente do riacho, deixando as águas calmas do lago. A sua primeira vida no mundo físico acabou por não correr muito bem. Foi uma vida difícil, repleta de sofrimento, onde praticou todo o tipo de barbaridades em nome da sua própria ignorância. Quando regressou, fê-lo de cabeça baixa tão envergonhada que estava da vida que tinha levado. Pensou que fossem recebê-la de dedo estendido e olhar inquiridor, pois muitos foram os erros que tinha cometido, mas não... todos receberam-na de braços abertos, de sorriso no rosto por terem de volta aquela que era como um irmão. Ainda perguntou se iria ser julgada, confusa que estava com a recepção, ao que o seu guia lhe respondeu que sim mas não por eles. Pensou logo na imagem de um juiz carrancudo e prepotente e da pena pesada que certamente iria impor sobre os seus erros. Mas logo esqueceu tudo isso, integrando-se plenamente nos afazeres da comunidade.

Um dia, um dos vigilantes que acompanhava o grupo onde a pequena gota estava integrada, e que era um ser muito mais evoluído que ela, disse-lhe que tinha chegado o momento de regressar. Para ela foi um choque. Agora que conhecia a turbulência da corrente do riacho, não queria mais deixar as águas calmas do lago. Respondeu que não iria regressar a esse mundo, que preferia viver ali onde tudo era perfeito. Ele, de expressão serena e compassiva, explicou-lhe que não era obrigada a partir, que essa era uma escolha sua. E assim ficou naquele lugar, satisfeita por saber que, se a escolha era sua, nunca mais iria regressar a esse mundo violento.

Mas com o passar do tempo, e de todas as vezes que visionava as imagens dessa sua vida no mundo físico, começou a apontar os erros e os defeitos. Dizia para si mesma que se um dia regressasse iria tentar corrigir aquela falha, tentar superar aquele obstáculo. E foi só então que a pequena gota compreendeu que o juiz não era nenhum ser prepotente, mas ela própria. Esse era o verdadeiro julgamento: aquele que ela impunha sobre si mesmo.

Procurou de imediato o vigilante, dizendo-lhe que estava disposta a encarnar para corrigir os erros do passado. Ele ficou satisfeito, e logo prepararam a sua nova experiência no mundo físico. Mas esta também foi uma vida difícil para a nossa pequena gota. Uma vida cheia de obstáculos que não conseguiu transpor. Tornou-se comerciante de escravos nesse mundo, desprezando esses seres que considerava inferiores.

Quando regressou, trazia nos ombros um peso tão grande que impossibilitou que se integrasse plenamente no seu grupo. Eles tentavam animá-la; diziam-lhe que era natural cometer erros no mundo físico... mas ela preferia a solidão, meditando sobre uma vida onde nada tinha aprendido. Não conseguia suportar aquele peso que tornava difícil a sua integração no grupo e naquele lugar de paz. Quando o vigilante, que era o seu guia espiritual, propôs-lhe uma nova vida no mundo físico, a pequena gota não hesitou um único momento em aceitar tal proposta. Queria encarnar como escravo e desse modo libertar-se do peso que tornava insuportável viver ali.

E assim, por vontade sua, sem que ninguém lhe impusesse tal escolha, encarnou como escravo, vivendo tudo aquilo que em tempos desprezara. Foi uma vida muito difícil, mas libertadora. Quando regressou vinha leve e feliz. Tudo à sua volta assumiu novas cores, possibilitando que se integrasse plenamente no grupo.

Depois sucederam-se muitas outras vidas numa cadência de milênios, umas
melhores, outras piores, dando-lhe a oportunidade de crescer na sua espiritualidade. Quando se adiantava em relação aos restantes membros do grupo, era integrada noutros grupos mais evoluídos até ao dia em que também ela se tornou vigilante de um grupo acabado de ser formado.

Quando se graduou nas lições do mundo físico, assumiu novos caminhos. Tornou-se aluna de uma outra escola, aprendendo a arte de criar vida no universo. No princípio manipulava a vida apenas ao nível celular, criando organismos simples, mas depois, numa sucessão de experiências e num amadurecimento crescente, tornou-se criadora de povos, de raças. Mais tarde, cada vez mais próxima do oceano nessa caminhada rio abaixo, criou planetas, estrelas, sistemas solares, galáxias.
E um dia, já muito perto da foz do rio que se precipitava nas águas do oceano, essa gota, agora grande de sabedoria e experiência, criou universos à sua imagem e semelhança. E só então penetrou na imensidade do oceano, regressando ao lugar de onde partira.

No princípio era uma pequena gota acabada de surgir na nascente da montanha, inocente e ignorante, mas agora era grande; agora era o oceano por inteiro.

E do vasto oceano uma nova gota destacou-se do todo, deixando o leito único de uma consciência que ela personificava na unidade de todas as coisas. Subiu depois até uma nuvem que a transportou a uma montanha de arribas escarpadas onde a pequena gota caiu sobre a forma de chuva, despertando na nascente da serra. E ali foi o princípio...

Pedro Elias

Recebido de Soraya Souza


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