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A LUZ QUE VEM DE DENTRO

Atualizado dia 10/21/2014 1:01:31 PM em Almas Gêmeas
por Antony Valentim


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Estava sentada num banco de madeira com o copo de vinho na mão, recostada na árvore. A música era animada, algumas pessoas dançavam, outras conversavam. O clima era de muita alegria e uma agradável energia envolvia aquele lugar. Nunca estivera ali antes, mas alguma coisa era familiar. Sentia-se estranhamente envolvida por uma vibração diferente. Chegara ali com tanta tristeza na alma, que não esperava se sentir tão bem como se sentia em meio a estranhos. Olhava nos olhos das pessoas, observava as conversas, e lentamente ia sorvendo o vinho como quem apreciava o doce sabor de uma dádiva.

Mas sua mente não estava ali. Os pensamentos estavam fixos na imagem do homem à sua frente na noite anterior, e sentia como se aqueles grandes olhos verdes ainda estivessem fixos nos dela. Não sabia definir o que sentiu por ele. Mas suas palavras soavam como sinos em sua alma. A experiência inicialmente pareceu simplória, mas com o passar das horas aquilo foi tomando uma forma muito maior dentro de sua alma.

Ofereceram mais vinho, e ela bebeu mais um pouco. Sentia a presença dos anjos naquele lugar, embora tivesse lá chegado acompanhada dos demônios. Mas agora não se importava com eles. Sabia que eles não poderiam tocá-la, e estranhamente atribuía essa certeza à experiência que viveu na noite anterior. E se recordava de cada detalhe.
Havia saído da cabana que alugara para passar o final de semana sozinha e caminhou alguns minutos até aquela espécie de mirante, de onde era possível ver todo o vale iluminado pela lua cheia. No dia seguinte haveria uma festa em comemoração ao solstício de inverno. Buscou com o olhar os detalhes do vale sentada na confortável cadeira em posição estratégica.

- Você não está com frio?

Assustou-se. Não havia notado a presença de mais ninguém ali até aquele momento, mas ao se virar, percebeu que provavelmente aquele homem estava sentado ali há algum tempo.

Luz baixa, árvores ao redor, uma varanda bem decorada com flores de várias matizes, adornos rústicos, mas de bom gosto, e cadeiras confortáveis espalhadas de forma que as pessoas pudessem contemplar o horizonte e apreciar o por do sol, conhecido naquela região como um dos mais belos espetáculos do lugar.

- Não, não sinto frio. Não te vi aí, me assustei.
- Me desculpe, não foi minha intenção. Qual é seu nome?
- Laís, e o seu?
- André, muito prazer.

Ela não queria continuar aquela conversa. Não queria os clichês de sempre. Não queria flertar com aquele homem, e menos ainda que ele estivesse ali. Mas não saberia ser mal educada. Nem tinha forças para isso.

Começaram a conversar sobre muitas coisas, e em menos de 20 minutos já sabiam o suficiente para não se considerarem estranhos.

- Você está triste? – perguntou ele
- Por que a pergunta? – respondeu ela
- Seus olhos não estão brilhando.

Sentiu que estava prestes a começar um flerte com aquele homem, mas não queria continuar com aquilo. Faltava-lhe disposição, vontade e até paciência. Queria inventar uma desculpa e voltar para sua cabana.

- Não... é impressão sua. Olha, tenho que ir.
- Você está conectada ao seu ser?

“Será que ele bebeu?” Pensou ela. “Que assunto é esse?” concluiu sem verbalizar.

- Não entendo o que quer dizer

Ele então se levantou da cadeira e se ajoelhou diante dela. Seu coração começou a bater mais forte. O que será que ele iria fazer? Preparou-se para gritar, mas no fundo não sentia essa vontade. Afinal, era um homem interessante e talvez fosse inteligente e uma boa companhia. Em uma fração de segundos, desistiu de se preparar para pedir socorro.

- O que você está fazendo?
- Toque minhas mãos – disse ele

Franzindo a testa, fez ar de estranheza e ficou imóvel

- Toque minhas mãos, não precisa ter medo. Vamos descobrir se você está conectada com o seu ser interior.

“Quem esse homem pensa que é para vir com esse tipo de conversa? Pelo amor de Deus...!”

Os pensamentos não conseguiam se transformar em palavras, e ela simplesmente fazia o movimento de estender as mãos sobre as dele.

- Coloque a ponta dos dedos médios na palma de minhas mãos

Ela obedecia, hipnotizada e ao mesmo tempo com uma pequena revolta interior por se deixar conduzir por quem mal acabara de conhecer.

- Agora feche os olhos.
- Fechar os olhos para que?
- Não se preocupe, não vou beijar você – falou com assertividade

Ela ficou com a face enrubescida, e soltou um sorriso sem graça. Não queria ser alvo de um jogo barato de conquista, não estava em clima de flerte, mas naquele momento algo lhe excitava diante de tudo aquilo.

- Está bem, mas sei que você não vai me beijar, não tem nada a ver isso. Nem te conheço.
- Ok, não vou beijar você e não farei nada que me faça ter contato físico com você além do que já estamos tendo. Vamos descobrir se você está conectada com seu ser. Você precisa disso.

A voz dele a acalmava de uma forma estranha, e começava a baixar a guarda.

- Está bem – disse ela

Fechou os olhos.

- Não abra os olhos. Apenas sinta seus dedos em minhas mãos e imagine-se aqui mesmo, onde você está, e com os olhos fechados, tente montar com a mente todo o cenário que nos cerca.

Ela fazia conforme ele pedia, e desenhava no pensamento todo o cenário presente. As jardineiras, os vasos, as cadeiras. Tentava se esforçar para ver até onde a coisa iria chegar.

- O que você está sentindo?
- Nada – respondeu ela

Mas ela mentiu. Sentia uma sensação incrivelmente boa com seus dedos nas palmas daquelas mãos, que embora abertas, parecia acolhê-la como um abraço. Ela precisava de um abraço. Não queria ser abraçada por ele, buscava outro abraço, mas àquela altura nem se importava mais se fosse o dele.

- O que você está sentindo? – perguntou ele novamente
- Já te disse, nada

Mas aquelas mãos macias começavam a despertar nela sensações que não sabia descrever.

- Continue de olhos fechados, e sinta o ambiente à sua volta. O sopro do vento, a brisa na face, o barulho dos grilos, o som dos animais da noite.

Ela se esforçava para perceber todas aquelas coisas, mas o que a incentivava era as mãos daquele homem. Não uma excitação legitimamente sexual, mas uma pequena revitalização íntima diferente.

- Não abra os olhos, e fique em silêncio até que eu peça para abri-los.

De repente, ele tirou as mãos de sob seus dedos e ela permaneceu ali, com os olhos fechados. Naquele momento, sentiu-se incomodada.

"O que será que ele vai fazer?" - pensou ela

Mas os segundos passavam e ela continuava na mesma posição.

- Você está aí?

O silêncio começava a lhe preocupar e sem conseguir se conter, abriu os olhos. Não o viu diante dela, e instantaneamente uma pequena frustração tomou conta dela.
Olhou para os lados, e num canto afastado ele estava sentado, observando o vale

- Ué, acabou?
- Sim
- Como assim?
- Já sabemos o resultado da experiência
- Não entendi nada
- Você não estava conectada a você. Estava conectada a mim. No momento em que deixou de sentir meu toque, seu semblante mudou lentamente até se tornar uma preocupação. Você estava em conflito com você mesma. E sem confiar o suficiente, abriu os olhos.

Ela se esforçava para compreender o sentido do que ele dizia, mas não conseguia.

- Não entendi nada

Ele se levantou, caminhou em direção a ela e se posicionou diante dela novamente. Olhou fixamente para seus olhos como se lhe penetrasse a alma e disse:

- Quando estamos conectados ao nosso ser, não importa muito a sensação física. Tocando ou não em minhas mãos, você continuaria confiando e não abriria os olhos, porque estaria olhando para dentro do seu ser, e não esperando um acontecimento exterior. Muitas vezes fazemos isso na vida. Se deixamos de sentir as mãos do outro, logo abrimos os olhos exteriores e nos esquecemos que deveríamos estar antes de tudo, olhando para dentro de nós mesmos. Porque é lá que as almas se encontram, e não no externo.

Aquele homem deveria ser louco, ou ela deveria estar entendendo tudo errado. Será que ele não a queria como mulher? Improvável. Era uma mulher bonita, e sabia que conseguiria encantar qualquer homem. E naquela situação, claro que ele deveria ter algum interesse nela. Ou não? Já não tinha certeza.

- Tá, e você queria que eu ficasse aqui parada até quando?
- Até quando eu dissesse para abrir os olhos
- Mas para que isso?
- Você veio para este lugar buscar o silêncio da noite, o som dos animais, a brisa do sereno, a paz que tudo isso transmite. Mas em momento algum esteve disposta a se conectar de verdade com todas essas coisas. Você estava preocupada comigo e com o que eu faria com você, e não com a experiência.

Ela se sentiu estranha naquele momento. Aquelas palavras faziam algum sentido, mas ela não compreendia onde ele queria chegar. Ficou em silêncio como quem faz uma expressão de que está pensando, olhando para o vale.

- Por que você soltou minhas mãos e foi logo para o outro lado da varanda? Não me ouviu te chamar? Por que não respondeu?
- Ouvi você me chamar. Eu estava na sua frente. Depois que soltei suas mãos, permaneci na sua frente quase o tempo todo, e só saí quando você precisou usar o exterior para ter certeza de que eu estava alí.
- Pensei que tivesse ido embora.
- Você estava preocupada em estar conectada na minha energia, e não à sua.
- Não tenho a menor ideia do que você está falando

Mas ela mentiu. Sabia o que ele queria dizer. Sabia que ele compreendeu que ela estava esperando algo mais ousado vindo dele, do que um simples soltar de mãos. Começava a entender que aquele era um sinal. Talvez a resposta do que fora buscar em meio às aflições íntimas que vivia.

- Estar na sua frente o tempo todo ou há cinco metros de distância de você não faz diferença. O que fez diferença foi quando soltei sua mão.

Ela se esforçava para compreender o sentido do que ele queria dizer. E ele torcia para que ela compreendesse, pois via sua alma. Era um homem jovial, e anos antes experimentou aquela mesma experiência vinda de uma estranha que o iniciou nos caminhos do invisível. Chegava a hora de retribuir depois de todas as coisas que ele descobriu a partir daquela experiência. Queria plantar nela uma semente. Percebia que seu estado d´álma era de uma tristeza profunda, e queria contribuir de algum modo para fazê-la se sentir melhor. E fazendo isso, ele devolveria ao universo a experiência que ele mesmo tivera anos antes. Mas precisava que ela compreendesse o sentido daquilo para a semente germinar.

- Quando soltei suas mãos, a luz dos anjos que começou a emanar em você se apagou, e você permitiu que se aproximassem os demônios.

Sentiu medo. Que homem era aquele falando de demônios? Que loucura era aquela? Não queria passar por outra experiência mística. Estava decidida a encerrar aquela conversa.

- Tá, e como você sabe disso? – perguntou em tom alterado
- Calma. Olhe em meus olhos e escute a minha voz.

Aquele olhar a hipnotizava, e estranhamente a acalmava.

- Se você está conectara ao seu ser, ao seu interior, você não precisa da energia do outro ser para manter sua luz acesa. Mesmo que ele se afaste, sua luz continua a brilhar, porque a fonte vem de dentro de você mesma.

Sentiu naquele instante um insigth, e tentou perceber o que aquele recém ex desconhecido queria que ela entendesse. Ele começava a dizer o que ela precisava ouvir.

- Você provavelmente veio para este lugar, buscar renovar as energias, sair do stress da cidade grande, comungar com a natureza, se desligar das decepções, esperando absorver deste ambiente a energia que te faltava.

- Sim, é verdade. Mas como você sabe disso? E que mal há nisso?
- Nenhum. Você apenas não estava conectada com você mesma. Precisa de uma energia externa para manter seu brilho. Mas quando você faz isso, fica dependendo da energia de outra fonte para manter sua luz. Ao redor da luz, moram os anjos. Se o outro solta suas mãos, e você depende da energia dele, vem a escuridão, e os demônios se aproximam.
- Você tem razão, quando você soltou minhas mãos eu fiquei diferente, confesso.
- É porque a luz que foi acesa, vinha do contato comigo. Não de você mesma. Se viesse de dentro de você, eu poderia soltar suas mãos e você ficaria ali por muito mais tempo, alimentando a claridade do seu peito com a sua própria energia, sem deixar os demônios se aproximarem e sem se sentir incomodada tão rápido.

Naquele momento ela abriu sua alma.

- Nenhum de nós deve depender da luz do outro, porque se o outro se desconecta, entramos na escuridão.

- E a escuridão atrai demônios?

- É uma forma figurada de dizer. Somos formados por Yin e Yang, temos dentro de nós recursos destrutivos e recursos edificantes. Ao estarem perto de nós os anjos, nossos recursos edificantes estão sendo amplamente utilizados. Se ficam porém os demônios que se alimentam da nossa escuridão da alma, usarão nossos recursos destrutivos.

Ela parou e pensou sobre aquilo. Fazia algum sentido, principalmente diante de suas recentes experiências pessoais. Compreendeu o que ele queria lhe dizer, e sentiu algo diferente no ar. Passou a ver aquele momento como especial. E depois de longos segundos em silêncio, disse:

- Se eu estivesse conectada a mim mesma como você diz, ao sentir seu toque, essa sua luz se juntaria à minha?

Ela havia entendido. E ele percebeu que ela absorveu a experiência. Torcia para que acontecesse assim, afinal, o universo conspirou para que ela estivesse ali naquele momento. Não era uma simples obra do acaso. Para ele, em nada havia acaso.

- Sim, as luzes se uniriam e promoveriam um brilho mais forte, em ambos. E os anjos permaneceriam mais tempo ao redor, pois essa luz os alimenta com mais intensidade.

Em um átimo de segundo, ela viu um filme diante dos olhos.

- Sempre que buscamos energia no exterior, somos reféns dessa fonte. Mas quando essa busca é feita dentro de nós, não importa o lugar, estaremos sempre iluminados pela luz de Deus. E se nos conectarmos a outra fonte de Sua luz, ela se expandirá!
- Mas não é Deus que nos ilumina?
- Exato! Mas Deus está em toda parte, principalmente dentro de nós. Mas as vezes não nos conectamos com ele. E a luz que brilha em nós, se torna trevas.
- Quem é você?
- Já me apresentei, esqueceu?
- Você entendeu a pergunta.
- Cada um de nós é instrumento. Você, eu, todos. Somos ferramentas. Hoje, eu sou instrumento da luz. Amanhã poderei ser eu a precisar espantar as trevas do meu interior. Dificilmente conseguiremos estar conectados com nosso ser todo o tempo. E nesses momentos, as trevas atrairão os demônios. Hoje, eu sou seu instrumento. Amanhã, você poderá ser o instrumento de outra pessoa, como um dia alguém foi o meu.

Segurou as mãos dela com indefinível ternura, e sugeriu a ela que passasse um tempo ali, tentando se conectar consigo mesma e com a Luz de Deus que havia dentro dela.
Por um bom tempo, tentou perceber os pequenos detalhes de cada tentativa, até que na última vez ela havia conseguido. E ao abrir os olhos na ultima vez, aquele homem não estava mais lá. Havia se passado muito tempo, e ela havia percebido que conseguiu se alimentar da força que vinha de dentro, finalmente. E repetiu a experiência muitas outras vezes até a noite seguinte.

Estava agora naquela agradável festa, olhando para um ponto fixo se recordando de tudo aquilo. Não viu mais aquele homem, mas sabia que ele havia aparecido em resposta às suas preces mais íntimas. Havia uma nova luz em seu coração. Porque ela buscava a energia que a alimentava dentro dela, e essa energia era a presença do próprio Deus, habitando seu ser. E sentia a presença dos anjos a envolvendo. Os demônios até podiam estar à espreita, mas ela não se preocupava com eles. Sabia que enquanto buscasse a força do divino dentro de si mesma, eles jamais conseguiriam se aproximar dela.

Neste momento, se recordou dos motivos que a fizeram ir até aquele vale, e percebeu que uma estranha certeza começava a habitar seu coração: a de que poderia seguir seu caminho em paz. Ela se sentia presenteada. Não sabia o que aconteceria dali por diante, mas como em tempos de outrora, ela jamais esqueceria a magia daquele momento.


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Conteúdo desenvolvido por: Antony Valentim   
Antony Valentim é um ser comum, sem privilégios ou destaques que o diferenciem das demais pessoas. Devorador de livros, admirador de culturas religiosas sem preconceitos, e eterno aprendiz do Cristo. Mestre de nada, sábio de coisa alguma. Alguém como você, que chora, sorri, busca, luta, exercita a fé e cultiva no peito a doce flor da esperança.
E-mail: [email protected] | Mais artigos.

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