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O Elefante

Atualizado dia 8/3/2008 10:35:42 AM em Autoconhecimento
por Eduardo Paes Ferreira Netto


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Por Eduardo P. F. Netto

- Vovô, vovô, conta aquela história de como o senhor perdeu os marfins, pediu Ricardinho, o mais novo dos pequenos elefantes, xodó de Galhardo, o velho paquiderme.
- Sim, vovô, conta, conta. Pediram os outros dois netinhos. Todas as noites eles se acomodavam ao lado do velho avô para ouvir as histórias sempre repletas das mais variadas peripécias.
- Não, não... negava o velho, sem muita resistência. Por que é que vocês gostam de histórias tão tristes?
- Conta, conta, conta! Insistiam os bebês elefantes.
- Está bem, está bem, não precisam gritar, não. E o velho mastodonte, limpando uma pequena lágrima que persistia em cair, concordou em rememorar seus dias de fausto, mas também de grandes sofrimentos por que havia passado em sua longa existência.
- Muito jovem ainda, eu era o maior animal da região. Por isso fui levado para servir no palácio do Marajá. Em meu dorso carregava reis, rainhas, príncipes e princesas, desfilava pelas ruas todo enfeitado; meus marfins eram pintados com tinta de ouro, minha cabeça coberta com tecido ricamente ornamentado; o palanquin era uma verdadeira obra de arte. E eu desfilava garboso, orgulhoso, balançando feliz a tromba para lá e para cá manifestando minha alegria e o orgulho que sentia por servir ao marajá. Era tratado como o rei dos animais. Vivia feliz.
- E por que está assim agora?
- Bem, um dia apareceu nas terras do marajá um meu parente maior e mais bonito que eu. O resultado é que terminaram me vendendo para outro potentado da região que não era tão rico e como eu dava muita despesa, terminou por me vender para um circo. Aí as coisas começaram a piorar. Obrigaram-me, a custo de muitas espetadas que me deixavam sangrando, a dançar e a fazer piruetas, a me levantar, ora nas patas traseiras ora nas dianteiras... e assim passei cinco anos sofrendo cada vez que meu tratador inventava uma nova apresentação. Geralmente, quando terminava minha apresentação a multidão aplaudia com entusiasmo, inconsciente do meu sofrimento, e o tratador sorria e agradecia feliz da vida. Quase morto de cansado eu voltava capengando para o cercado.

- Um dia resolvi dar um basta àquela situação humilhante; eu, um animal nobre, que teve em seu dorso reis e rainhas, sujeitando-se agora a alegrar uma multidão que não tinha idéia do meu sofrimento para lhe proporcionar aqueles momentos de prazer. Passei a imaginar um meio de acabar de vez com aquilo tudo. Durante uma semana inteira, enquanto o circo era montado numa grande capital do país, uma turma passou a desfilar pela cidade, mostrando as atrações: a banda de música, os tigres, ursos, cavalos enormes, palhaços, bailarinas e eu, carregando o miserável do tratador que vez por outra me cutucava com seu ferrão para eu fazer uma graça qualquer. Os acrobatas demonstravam suas habilidades, os palhaços faziam graças e vez por outra gritavam:
- Hoje tem espetáculo?
- Tem, sim senhor, gritavam os outros.
- E o palhaço, o que é?
- É ladrão de mulher! Há, há, há...

E assim percorríamos os bairros da capital. Na volta estávamos todos muito cansados.
Era uma semana de festas naquela capital - no sábado comemorava-se seu aniversário - e o circo estava cheio. Eram aplausos e uma gritaria infernal a cada apresentação dos artistas e dos animais. Por fim chegou a hora de minha apresentação; estavam todos ansiosos para ver o elefante dançarino, conforme anunciavam.
O tratador à minha frente, tendo à mão seu instrumento de tortura, metido num traje ridículo, gesticulava feliz para a multidão. A banda iniciou o dobrado com o qual eu fazia algumas piruetas. O povo gritava que queria ver o elefante dançar como fora anunciado nos percursos pelas ruas.

Chegou, então, o glorioso momento. A banda iniciou a valsa Danúbio Azul do grande compositor Strauss. A multidão, em silêncio, aguardava a performance. No centro do picadeiro eu permanecia parado. O tratador me pedia para dançar... gritava, xingava e eu balançava a cabeça dizendo que não. A multidão gritava, o tratador enfurecia-se, mas não podia me espetar diante do povo... gritava e me ameaçava e eu simplesmente balançava negativamente a cabeça. Num determinado momento ele passou à minha frente; eu o peguei com a tromba e o balancei de um lado para outro, jogando-o finalmente para o alto. Já no solo, desmaiado, passei por cima dele, dei-lhe uma bela mijada e por fim aquela cagada. O povo gritava, aplaudia, julgava que fazia parte do espetáculo. Foi uma verdadeira apoteose.

Os elefantinhos rolavam de alegria.
- Bem, um dos empregados do circo me atirou um dardo com substância tranqüilizante e em pouco tempo fui ao chão e fui arrastado para fora do picadeiro. A multidão gritava, queria mais.
Não voltei mais ao picadeiro. Disseram que eu havia enlouquecido. Mas que doido que nada! Eu estava cansado e aborrecido com tudo aquilo e resolvera me vingar. Diariamente me aplicavam o tranqüilizante. Um dia quando acordei estava sem meus marfins e abandonado numa floresta, quase morto.
Um grupo de seres humanos me encontrou naquele estado e passou a cuidar de mim; logo recuperei minhas forças e por hoje já chega de histórias... vão, vão, vão tratar de dormir, seus moleques travessos.
O velho Galhardo rolou para um lado e também dormiu e sonhou.

Texto revisado por Cris

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