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Maresia

Atualizado dia 3/5/2008 9:38:53 AM em Autoconhecimento
por Eduardo Paes Ferreira Netto


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M A R E S I A



Sempre gostei do mar! Ficava horas inteiras na praia, sentindo as ondas virem morrer a meus pés e aspirando o ar carregado de maresia, o que já naquele tempo me enchia a alma de inolvidável prazer.

A areia da ampulheta de Chronos lamentavelmente não parava de cair, e ela virou e desvirou muitas e muitas vezes, deixando marcado em cada face, em cada corpo, em cada coisa seu indesejável sinal.

Já adulto voltei àquela praia. Não era a mesma. O mar avançara por terra a dentro e daquelas casinhas da infância que orlavam o litoral só restavam ruínas.

As luas cheias traziam ressacas, as de agosto então eram terríveis, ainda o são.

Encarapitado numa daquelas ruínas, numa lua daquele mês, observava o oceano que vinha em fúria bater nas pedras e violentamente jogar água para o alto.

No local em que me encontrava recebia no corpo aquela chuva salgada que me deleitava a alma.

Era noite, a lua cheia traçava sobre a superfície do mar uma estrada de luz prateada. O oceano rugia furiosamente e uma horda de tritões, cavalgando vagas enormes aproximava-se velozmente de minha ruína.

As ondas atingiram o quebra mar. Os tritões lançaram seus tridentes em minha direção sob os olhares concupiscentes de algumas sereias.

Quis me mexer, levantar-me, fugir dali. Não consegui!

As armas, ao me atingirem transformavam-se em gotículas de luz e maresia que me envolviam completamente. Havia um quê de mistério no ar.

Novos vagalhões vinham bater nos rochedos e voltavam, dando lugar a outros. São levas e levas de guerreiros que buscavam conquistar a terra numa luta eterna.

Surgiam do fundo mar, avançam, jogavam seus tridentes e regressavam para voltar logo após.

Em uma hora de violenta luta, aqueles guerreiros estavam exaustos e o mar começava a amainar. Mais uma hora e o mar estava totalmente calmo. Daquelas vagas gigantescas, restaram ondas menores, povoadas de minúsculos seres e vegetação que se desprendera dos corais.

Algum tempo após o mar voltou a se enfurecer, mas os tritões não voltaram.

Impregnado pelo cheiro da maresia senti alguma coisa diferente se processando em meu interior.

Aquele cheiro ia entrando por todo meu corpo, proporcionando-me um prazer indescritível e inexplicável sentimento de força e poder.

Meus braços engrossaram, ficaram peludos, os bíceps se avolumaram, os músculos do peito tornaram-se salientes e uma barba negra, espessa rodeou-me o rosto. Dou-me conta de que estou sentado num rochedo segurando enorme tridente na mão direita. Os cabelos longos, desgrenhados, voejavam ao vento forte da quase tempestade.

As pernas foram substituídas por enorme cauda, forrada de escamas de prata.

O olhar fixo no horizonte parecia procurar alguém.

Um cheiro mais forte de maresia chegou-me às narinas. Levantei mais a cabeça e procurei divisar ao longe sua origem. Jovem sereia aproximava-se graciosamente. Mergulhei nas águas e nadei velozmente ao seu encontro. O cheiro ia se tornando cada vez mais forte. A sereia estava no cio, procurava acasalar-se.

Era uma bela jovem, a longa cabeleira loura, os olhos grandes de um azul claro, brilhantes, os dentes eram uma fieira de pérolas, os seios redondos e firmes, a cintura fina e a cauda, ó que beleza de cauda. Era um encanto de sereia.

Aproximei-me, cortejei-a, dei voltas ao seu redor, fiz acrobacias fantásticas. Agradei-a. Partimos para as profundezas.

À nossa frente uma montanha de coral. Avancei até aquela formação enorme e de lá tirei um cacho de pequenas esmeraldas e um cordão de ouro com que fiz um colar. Aproximei-me por trás e delicadamente coloquei-o em volta do seu pescoço.

Abraçamo-nos, beijamo-nos e por fim realizamos o sagrado himeneu, garantia de perpetuação daquela espécie. Separamo-nos e rodopiamos juntos por algum tempo, manifestando nosso mútuo prazer e nos despedimos com prolongado beijo.

Minha companheira sumiu no fundo do oceano sem fim, eu voltei ao rochedo.

A lua cheia havia desaparecido por trás dos montes. Os tritões voltaram, e enfurecidos jogavam seus tridentes em minha direção.

Levantei-me, já não era mais o apaixonado tritão, apenas um humano cheirando à maresia.

Jamais esqueci aquele luar de agosto.

F I M





































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