Quando Pedro fala de Paulo, sei mais de Pedro do que de Paulo

Jesus dizia que, antes de olhar o argueiro no olho do outro, devemos remover a trave que está em nosso próprio olho. Com isso, Ele já falava de projeção - muito antes de Freud, Heidegger, Jung ou outros grandes pensadores modernos. Podemos inferir, então, que muitas das verdades reveladas ao longo da história do conhecimento humano já haviam sido expressas por Jesus. Afinal, como está escrito em Eclesiastes: "Não há nada de novo debaixo do sol" (Ec 1:9).

A projeção é um conceito que merece mais atenção. Quando alguém se comunica, revela-se por inteiro - isso é evidente. Toda a nossa interação com o mundo parte de nossa visão de mundo e da forma como interpretamos as informações externas. Por isso, faz sentido o ditado: "Quando Pedro fala de Paulo, sei mais de Pedro do que de Paulo."

A melhor forma de conhecer alguém é ouvi-la falar sobre qualquer assunto. Suas opiniões revelam seus preconceitos, crenças e sua visão particular do mundo. A mente humana pode ser comparada a um programa que foi sendo montado com "bytes" específicos. Cada indivíduo vai juntando crenças como se fossem caracteres, até formar um software único - o próprio caráter. Assim, cada um, mesmo inconscientemente, atua como um Dr. Frankenstein, construindo o monstro com o qual terá que lidar. Talvez seja essa a principal lição do famoso mito.

Ter uma visão amorosa, violenta, pacífica ou agressiva são apenas possibilidades dentro da construção de uma personalidade. Cada um escolhe e desenvolve suas próprias formas de ser. Não há culpados: cada um é o artífice de si mesmo e, inevitavelmente, terá de lidar com aquilo que criou.

Construímos nosso personagem, e o Universo o lapida. Simples assim. Sofreremos o martelo da lapidação de Deus até que o brilho da perfeição se manifeste. Por isso, o violento será violentado, o pacífico será pacificado, o agressivo será agredido e o amoroso será amado. Tudo isso para que possamos compreender o que a Vida espera de nós.

O único verdadeiro desafio que o ser humano enfrenta durante toda a sua existência é ele mesmo. Não há nada fora que precise ser mudado. A ignorância nos prende à ilusão de uma instância externa, fazendo-nos projetar nossas sombras nos outros. É nesse contexto que frases como a de Sartre - "O inferno são os outros" - ganham uma nova leitura: o inferno, na verdade, é aquilo que não conseguimos reconhecer e integrar em nós mesmos, e que acabamos enxergando nos outros.

Qualquer terapeuta experiente sabe que, quando uma pessoa começa a falar do filho, do marido, do tio, do vizinho ou do sócio durante uma sessão, na verdade está falando de si mesma. É nesse momento que o inconsciente se manifesta, e é por meio dessa manifestação que o terapeuta consegue acessar a programação emocional do seu paciente.

Desde os tempos de Jesus até os fundamentos da psicologia moderna, uma verdade se destaca: conhecer a si mesmo é essencial para compreender o mundo e os relacionamentos. Ao olharmos para dentro, percebemos que somos os criadores de nossas experiências e os protagonistas das mudanças que desejamos. Tudo o que pensamos e dizemos molda não apenas nossa percepção da realidade, mas também quem somos. No fim das contas, é olhando para dentro que podemos, de fato, entender e transformar a realidade à nossa volta.