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Autoconhecimento
O Símbolo dos Porcos e a Condição Humana sem Consciência
por Paulo Tavarez
O porco, na tradição simbólica, representa o ser humano reduzido ao
nível instintivo, dominado apenas pelo apetite, pelo desejo imediato, pela repetição mecânica da vida. Quando a consciência se apaga, o homem deixa de ser senhor de si mesmo e passa a viver como animal, sem clareza, sem direção, guiado por forças que não domina.
Esse estado aparece de forma contundente em dois relatos distantes no tempo, mas profundamente próximos no sentido: o
mito de Ulisses com Circe e o
Evangelho de Jesus entre os gadarenos.
Na
Odisseia, Circe transforma os companheiros de Ulisses em porcos. Homens que tinham razão e voz, de repente passam a grunhir, a viver como animais presos ao instinto. É uma imagem do que acontece quando nos deixamos enfeitiçar pelas ilusões, pelo prazer sem consciência, pelo esquecimento da verdadeira identidade. Ulisses, porém, protegido pela erva dada por Hermes — símbolo do discernimento — resiste ao feitiço e, com sua firmeza, liberta os companheiros, devolvendo-lhes a forma humana. A cena mostra que a consciência desperta é capaz de vencer a sedução dos instintos e restaurar a dignidade perdida.
No
Evangelho, Jesus encontra os endemoniados gadarenos, homens possuídos por forças que os desumanizavam e os afastavam da convivência. Eles viviam entre os sepulcros, símbolo de uma vida sem vida, dominada pela sombra. Ao libertá-los, Jesus permite que os espíritos impuros que os dominavam, entrem numa manada de porcos, que imediatamente se precipita no mar. O porco, aqui também, representa o
invólucro animalizado que não pode sustentar a consciência espiritual. Os homens, libertos, voltam a si mesmos: vestidos, conscientes, sentados em paz.
Ambos os relatos, cada um à sua maneira, nos ensinam que o
ser humano sem consciência vive como porco, escravo dos instintos, das ilusões e das forças inconscientes. Mas também mostram que há sempre uma possibilidade de transformação: pela força espiritual que Jesus manifesta, ou pela lucidez e discernimento de Ulisses, é possível recuperar a verdadeira forma humana — aquela que pensa, que escolhe, que desperta.
Assim, tanto o mito quanto o Evangelho apontam para a mesma verdade:
a consciência é o que nos diferencia da animalidade. E o caminho espiritual, seja narrado pela poesia grega ou pela palavra do Cristo, é sempre um chamado para deixar de viver como porco e reencontrar a nobreza da condição humana.
Texto Revisado
Atualizado em 28/08/2025
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