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Agora que voltei para casa - Capítulo 3

Agora que voltei para casa - Capítulo 3
Publicado dia 5/28/2004 12:59:38 PM em Espiritualidade

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Vencido pela minha insistência, meu pai concordou em me pagar um curso de datilografia e taquigrafia. De posse do diploma, pude ser admitida como auxiliar de secretária numa firma que ficava na mesma rua onde eu morava (bons tempos aqueles, em que os empregos abundavam, a ponto da gente poder escolher).

Esse emprego, porém, não durou muito. Minha tarefa consistia em tomar ditado de um alemão que falava com um sotaque horrível, para depois transcrever à máquina minhas anotações. Não era uma tarefa das mais fáceis para uma marinheira de primeira viagem.
Todas as novas dificuldades contribuíam para que me sentisse cada vez mais um peixe fora d’água. Como era meu hábito desde sempre, aproveitava todos os momentos livres para escrever furiosamente, num caderninho, todos os meus desabafos adolescentes.
Um dia, no meio dessa operação, ouvi meu chefe gritar a plenos pulmões: “A senhorrrrra está sentada sobrrrrre as orrrrrelhas?” É claro que algum tempo depois fui sumariamente despedida.

O episódio representou na verdade um progresso em minha vida. Arranjei um emprego no centro, onde podia ir de ônibus, numa agência de publicidade de donos italianos, onde o trabalho era muito mais interessante e divertido.
Foi aí que fiquei sabendo da existência de “Cursos de Madureza” onde poderia recuperar o tempo perdido, conseguindo o diploma colegial em muito menos tempo.
Foi uma fase de minha vida em que tudo convergia para aumentar minha auto-estima. Na agência tinha a oportunidade de conviver com profissionais de muito talento, que estimulavam minha necessidade de desafios intelectuais. Sentia-me valorizada e motivada a aprender cada vez mais. Saindo do trabalho ia diretamente para o curso de madureza, onde a maior parte dos alunos era formada por rapazes que me demonstravam sua admiração de todas as maneiras. Tinha, como se diz em italiano, “a beleza do asno”. (Como todas as expressões que refletem a sabedoria popular, essa tem a genialidade de ilustrar, em duas simples palavras que surpreendem pela insólita associação, um certo momento na vida de uma pessoa. É quando não se precisa de nenhum artifício para atrair as atenções, basta o frescor da própria juventude). Outra grande aliada para meu sucesso no curso era minha formação escolar, que tornava extremamente fáceis todos os conteúdos ensinados. Até os professores demonstravam claramente seu apreço, o que fazia subir cada vez mais minhas cotações.
Naquela época, via M. muito esporadicamente. Como nossos encontros eram sempre muito rápidos, por não podermos assumir abertamente nossos sentimentos, tudo se resumia a abraços e beijos mais ou menos ousados, sobrando muito pouco tempo para diálogos verdadeiros sobre nossas vidas. Ele tinha chegado a me propor um compromisso mais sério, mas honestamente eu não me sentia talhada para encerrar tão depressa meus horizontes dentro de quatro paredes, pois estava claro que tudo o que ele queria era uma boa esposa que cuidasse muito bem da casa e dos filhos, e nada mais. Ele nunca deixava de me repetir, aparentemente em tom de brincadeira, que uma mulher não precisava estudar tanto. Além disso, a hostilidade dos meus pais e a efervescência do momento que estava vivendo tinham feito diluir bastante meu interesse por ele. A partir daí nossos caminhos começaram a tomar rumos diferentes, mas toda vez que eu sentia a necessidade de procurá-lo ele dava um jeito de aparecer à saída do cursinho para me levar para casa. O que nunca tinha diminuído era a atração física um pelo outro.

Eu estava adorando meu trabalho na agência de publicidade e o fato de poder ir diretamente para a escola à saída do trabalho, o que adiava para mais tarde minha volta para casa, onde queria ficar o menor tempo possível. Superados com êxito os exames de madureza, descobri outra maneira de ocupar minhas noites: poderia cursar uma faculdade noturna. Uma primeira opção teria sido a faculdade de psicologia, mas quando vi que haveria exames de matemática e estatística, perdi o interesse. Pensei então numa faculdade de letras, e me inscrevi imediatamente no cursinho da própria faculdade, que na época se chamava “Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo”.

Enquanto isso, outra mudança estava se dando no campo do trabalho. Um rapaz que conheci numa festa me convenceu a me apresentar como candidata a uma vaga de secretária no Banco onde ele trabalhava. Eu não tinha muito interesse em mudar de emprego, mas tanto ele insistiu que resolvi aceitar o desafio.
Quando me apresentei, fiquei sabendo que se tratava de secretariar um diretor italiano que tinha acabado de chegar, e não conhecia uma palavra de português. O teste a que fui submetida foi muito engraçado, esse diretor me ajudava em todas minhas dificuldades (principalmente de taquigrafia), mostrando um empenho especial para que fosse aprovada.
Mesmo tendo sido aceita, hesitei muito antes de me decidir, porque não queria perder meu ambiente na agência. Mas a insistência e a perspectiva de um ganho muito maior acabaram me convencendo. Lá fui eu trabalhar numa enorme sala, dentro de um dos Bancos mais importantes de São Paulo, onde só ficavam o diretor, o contador e eu. Estávamos fundando uma Financeira que juntava o Banco italiano e o brasileiro num tipo de sociedade inédita até então.

No começo senti muito a falta do movimento e da animação da agência de publicidade, mas aos poucos a nova situação foi mostrando suas vantagens. O diretor italiano era um apaixonado por literatura e demonstrava um verdadeiro interesse pelos meus estudos. Nessa altura eu já tinha entrado na faculdade, e muitas vezes, quando tinha terminado meu trabalho, incentivada por ele, fazia minhas lições ali mesmo. Frequentemente ele se punha a declamar as poesias e os trechos literários que todos nós italianos de uma certa geração sabíamos de cor...

continua...

por Angela Li Volsi

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Sobre o autor
Angela Li Volsi é colaboradora nesta seção porque sua história foi selecionada como um grande depoimento de um ser humano que descobriu os caminhos da medicina alternativa como forma de curar as feridas emocionais e físicas. Através de capítulos semanais você vai acompanhar a trajetória desta mulher que, como todos nós, está buscando...
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