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O Taoismo e a Imortalidade

por Elisabeth Cavalcante em Espiritualidade
Atualizado em 06/10/2003 11:50:32


“Imortalidade” é o termo pelo qual os taoistas em cada nível de entendimento designam sua meta. Daí o título de “imortal” conferido aos sábios, mestres de ioga e mesmo antigos reclusos, aos quais, em virtude de seu saber, se atribui a conquista do objetivo. Imortal é aquele que fazendo valer ao máximo seus poderes físicos e mentais, calando a paixão e banindo o menor desejo, atingiu a existência livre e espontânea – um ser tão próximo da perfeição que seu corpo não passa de abrigo ou receptáculo para o puro espírito.

O Tao é incognoscível, vasto, eterno. Em seu aspecto não-diferenciado, é visto como um fluxo infindável, e todas as coisas se acham sujeitas à mutação a cada instante; não obstante, as mudanças se fazem em ciclos regulares, enquanto cada esquema se repete ao infinito. Tais ciclos são previsíveis, como por exemplo, a alternância do dia e da noite e as quatro estações.

Os taoistas aprendem a contemplar e a investigar as várias seqüências de mutação; e a contemplação engendra a tranqüilidade que sobrevém quando a perda, a decadência e a morte são reconhecidas como não menos essenciais ao todo que o ganho, a ascensão e a vida. Segundo ensinou Lao Tsé, é melhor confiar as coisas ao Tao, sem intervir em seu curso natural.

Se há uma palavra que tem predominância no taoísmo é: serenidade. Um taoista dedicado é aquele que procura viver o mais possível em harmonia com a natureza. Quando se toma a natureza por guia, o viver se torna fácil, calmo, alegre, as preocupações se vão, a serenidade se instala.

Um dos maiores estudiosos ocidentais do taoísmo, John Blofeld, define alguns dos princípios que norteiam a ação do taoista: “ Wu wei, princípio cardeal dos taoistas, literalmente quer dizer não-ação, mas não no sentido de postar-se inerme como um tronco ou uma pedra; significa antes evitar ações que não sejam espontâneas, atuar plena e intensamente apenas naquilo que constitui a necessidade presente, estar alerta sem fadiga e calcular cada ato em função de um bom motivo”.

Lendas dos Imortais
O taoísmo é repleto de histórias curiosas, de caráter diferente, mas todas referentes aos imortais. Uma das inúmeras histórias recolhidas por Blofeld, é conhecida como “ A lição da névoa branca” e conta o seguinte:

“No reinado do Imperador Shen Tsung (1573-1620), um estudioso chamado Fan, nativo de I Ping, distinguiu-se de tal modo nos exames públicos, que recebeu uma série de cargos de importância em diversas regiões do império.
Aonde quer que fosse deparava com os males da sociedade: cupidez, avareza, luxúria, vaidade, crueldade e opressão. De licença em sua terra natal quando da morte do pai, resolveu não mais voltar à vida oficial e retirar-se para as montanhas, em busca do Caminho.

Nas vizinhanças do monte Omei, adquiriu uma pequena cabana onde, em meio aos rigores do inverno, se dedicou a seus livros e pôs-se a meditar diariamente. Um regato próximo abastecia-o de água pura; para alimento comprara uns poucos sacos de arroz e uma ou duas jarras de óleo, parcos recursos a que acrescentou os produtos da floresta: cogumelos, brotos de bambu e inúmeras plantas suculentas e saborosas. Nos dias amenos, erguia-se para contemplar o panorama de nuvens flutuantes, tintas de coral e bordejadas de ouro, pondo-se depois a vaguear pelos cumes e vales à cata de ervas medicinais e petiscos para a mesa; não raro dormia à luz das estrelas.

Depois de três anos, seu coração já estava em sintonia com os mistérios comuns da natureza; mas o Tao, este lhe escapava. “Sei que ele está aqui. Percebo suas transformações, suas dádivas e suas requisições; mas, velado e esquivo, como segurá-lo”?
Embora conhecido dos poucos vizinhos como hábil curandeiro e consumado imortal, tinha-se na conta de um andarilho que desertara do mundo de pó.

Um dia, recebeu um visitante que, embora toscamente trajado como camponês, revelava o aspecto sábio e juvenil de um verdadeiro imortal. Abrindo um jarro de vinho que não tocara desde a chegada, Fan ouvia com veneração seu hóspede.

Disse este: “Tenho a honra de ser seu vizinho mais próximo na qualidade de gênio do regato que corre em frente à sua distinta morada. Posso perguntar por que um estudioso tão conspícuo falhou em encontrar o ponto de partida do Caminho, especialmente quando ele está bem diante de seu nariz”?
Depois, tocado pela confusão de Fan e querendo deixá-lo à vontade, o gênio acrescentou: “Esse é um indício de sua sabida inteligência, senhor. Há quantidade de reclusos que se persuadem de ter encontrado o Caminho sem nada para justificar tal pretensão. Não o procure nas nuvens brilhantes da aurora e do crepúsculo, nem na claridade do céu outonal. Busque-o na neblina que flutua pelos vales aos quais, até hoje, sequer condescendeu em lançar um olhar”. Dito isto, o gênio fez uma polida reverência e se retirou.

Daí por diante nosso estudioso passaria os dias sentado numa pedra, contemplando, lá embaixo, a branca névoa que flutua pelos vales. Nenhuma iluminação espiritual aconteceu, mas ele persistiu. Três anos se passaram. Os lenhadores das cercanias, vendo-o estático como uma rocha, horas a fio, davam graças aos céus por terem enviado um imortal para habitar entre eles. O bom tempo era atribuído a ele e à sua virtude; o mau tempo, sussurrava-se, poderia ser pior sem ele. Veio então o dia em que Fan se adiantou pressuroso e cheio de júbilo para onde o regato borbulhava escapando de uma grota e invocou o gênio, que surgiu envolto em brocados sobre fina seda.

“Não precisa contar-me!”, estrondeou o gênio numa voz poderosa. “Você encontrou o Caminho. Posso perguntar como”?
“Ah, ah, ah”, riu Fan. “Por que não disse antes? Não encontrei o Caminho; apenas, de repente, dei-me conta de que nunca o perdera. As nuvens carmesins, o sol acre do meio-dia, a marcha das estações, as fases da lua – nada disso são funções majestáticas ou símbolos auspiciosos do que subjaz além. Tudo isso é o Tao. Nascer, respirar, comer, beber, andar, sentar, acordar, dormir, viver, morrer – fazer isso é palmilhar o Caminho.

Quando se sabe acatar os fatos sem preocupações de gozo e de tristeza, vestir este ou aquele manto conforme a necessidade, recolher pinhões ou cogumelos não para o paladar, mas para a fome, dar apenas os passos necessários, acolher as coisas como elas são – então se é um com a névoa do vale e os bulcões flutuantes... Então se conquistou o Caminho, nascendo-se para a imortalidade. Gastar anos em busca do que nunca se perdeu é de fato uma pilhéria”.

A gruta diante da qual se postavam ecoava com seu riso sacudido. O gênio então se recompôs. Os brocados e fitas de sua roupa bailavam ao vento, pendeu a cabeça nove vezes, como em reverência a um imperador, e gritou, alegremente: “Eis que enfim encontro meu mestre”!


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elisa
Elisabeth Cavalcante é Taróloga, Astróloga, Consultora de I Ching e Terapeuta Floral.
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