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Na Penumbra da Cripta - III

Atualizado dia 5/10/2007 5:02:10 PM em Autoconhecimento
por João José Baptista Neto


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O peregrino deverá seguir todo um caminho para chegar à cripta, aos pés da estátua da Virgem. Ele vai passar figurativa e materialmente do mundo profano ao mundo sagrado. Antes de tudo abrirá o caminho até o portal da igreja e, atravessando o átrio, mudará de universo. Depois percorrerá o vão central da nave para chegar à encruzilhada do cruzeiro que divide em dois a igreja, separando definitivamente o profano do sagrado antes de ascender ao recinto. Chegará à porta baixa que, por uma escada estreita, o fará se enterrar nas entranhas da terra. Essa escada ele a vai percorrer duas vezes. Vai descer para voltar a subir. E quando volta, ele será mais rico do que o era ao chegar. ”Quem se eleva será rebaixado, quem se rebaixa será elevado” dizem em três ocasiões os Evangelhos. Esse limite ultrapassado é de alguma maneira uma etapa sobre o caminho do conhecimento que simboliza a escada. Tradicionalmente, o descer representa a busca do conhecimento esotérico e a subida, o do conhecimento exotérico; assim sendo não há conhecimento mais completo do que quando se reunem os dois. O descer se interpreta também, aqui, como uma tomada de consciência. A subida seria sua posta em prática depois da volta para a luz do mundo profano que o peregrino reencontrará após haver percorrido de novo os diferentes espaços da igreja, mas no outro sentido dessa vez. E esse mundo profano, ele, o peregrino havendo recebido nas profundezas da terra uma parcela de saber e uma chispa da luz escondida, deverá contribuir para transformá-lo. Deve fazê-lo, porque ele viveu de alguma maneira um renascimento por uma adesão ao real situando-se em outro plano e mais além das coisas.

J. Bonvin, em sua obra "Virges Noires, la réponse vient de la terre", diz haver constatado que nas igrejas em que as Virgens Negras ocupam ao contrário do lugar que lhes era primitivamente outorgado (o que está longe do que ocorre hoje em dia), elas estão orientadas de tal maneira que ficam de frente para o quadrante noroeste. Quer dizer que elas olhavam para o ponto de saída do sol no solstício de verão.

Não seria de nada surpreendente que essa constatação corresponda a uma realidade voluntariamente querida, dada a quantidade de elementos simbólicos que rodeiam nossas estátuas. Recordemos rapidamente que os dois solstícios, “Porta dos Céus” para o de verão e “Porta dos homens” para o de inverno, estão em relação ao esoterismo cristão e na tradição iniciática com os dois São João. A estátua da Virgem faz assim frente à saída do sol no dia da luz maior, no dia em que a noite é mais curta. A escuridão está como que escondida no instante nele que vai recomeçar a lenta descida para as sombras da terra, quando se abre a “Porta dos homens”. É o banho da luz celeste em seu máximo de potência que deve iluminar o ser interior realizando, simbolicamente, a conjunção dos contrários (luz-sombras) assim como o mostra a cripta e a cor negra com relação ao solstício.

No oráculo sobre a Babilônia, cidade emblema das nações perdendo-se na materialidade, onde os homens já não têm a luz do saber iluminando o cotidiano, quer dizer o âmbito de múltiplo, está escrito “O sol em sua saída está sombrio”, Is. XIII, 10. Porém, o mesmo profeta evocando a prosperidade futura de Sión enuncia “a luz da lua se fará como a luz do sol”, Is. XXX, 26, enquanto que, nós o sabemos, “Aquela que surge do deserto é bela como a lua”, Cant. 1,10. E essa luz é a do conhecimento que se vive no interior, é o âmbito da unidade.

Esse quadrante noroeste teve sempre uma importância particular. É o lugar do amanhecer, o da passagem entre a noite e o dia, o que nos deve lembrar essa “aurora” do Cantar dos Cantares. Faz-se aí uma imagem da conversão pela acolhida da luz nascente. Era o lugar onde se punha a primeira pedra, da pedra fundamental sobre a qual se ia ancorar o edifício. As pedras dos outros ângulos eram a continuação situadas sucessivamente no sentido da marcha aparente do sol. É nesse ângulo onde era erguido o primeiro muro atrás do qual se abrigaria o depósito dos materiais de construção e onde se realizavam os planos necessários para a construção e onde se ensinava a arte do traçado considerado como um segredo de ofício. Nossa Senhora, a Negra, Aquela que é “como a aurora, bela como a noite” - Canto 6, 10 - oferece a possibilidade de se acercar da verdadeira luz encerrada nas sombras - Jo 1,5 - e da qual é a depositária. Ela está ali, na cripta aprazível, pronta a dar sem medida a quem venha com o coração puro. (“Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus” – Mt. 5, 8 e Sl 51, 12-13). A escuridão, na verdade, corresponde menos a uma ausência de luz que a uma luz escondida e essa luz invisível aos olhos dos insensatos, dos homens divididos em si mesmos, essa luz não brilha mais que para aqueles que chegaram às misteriosas bodas, às Bodas da Unidade.

Cripta, imagem da gruta. Cripta, lugar escuro situado nas entranhas da terra, figuração do ventre materno que nos leva de múltiplas maneiras ao conceito arcaico da Deusa Mãe, cripta que se situa na fronteira do mundo dos vivos e do mundo dos mortos, lugar onde nossos distantes ancestrais buscavam a comunicação para estabelecer uma espécie de continuidade mais além da temporalidade. Cripta, lugar de excelência para buscar e tentar reencontrar a paz e a plenitude da alma e do espírito. Não é natural que haja sido o santuário da Dama Negra?

Fragmentos extraídos de “Realités e Mystères des Vierges Noires”

Texto revisado por Cris

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